Gramsci
Érika Zuza,
Luzigrácia Rocha,
Karla Pereira e
Janaína Almeida (*).
HISTÓRICO
Antônio Gramsci nasceu em 1891, em Ales, na
ilha da Sardegna, um dos lugares mais pobres e atrasados da Itália. Durante sua
infância, além de sofrer a exclusão social por ser pobre, também, sentiu na pele
o que é ser excluído por deficiência física, pois, aos quatro anos de idade,
sofreu uma queda que o deixou corcunda. Ao longo de sua juventude, Gramsci
percebeu que as desigualdades sociais dominam a sociedade em que vive, e que é
preciso uma ideologia que modifique este quadro, e dê a classe social
marginalizada força para participar das decisões sociais.
O contato com o socialismo começou muito
cedo, quando ainda jovem, recebia de seu irmão periódicos do jornal Avanti! Do partido socialista italiano,
no qual trabalharia como jornalista mais tarde. Gramsci também participava de
grupos juvenis socialistas onde eram discutidos os problemas sociais e
econômicos da Sardegna. Em 1911, graças a uma bolsa de estudos ganha
em um concurso, ele ingressa na Universidade de Turim, onde cursa, parcialmente,
a Faculdade de Letras e Filosofia.
Em 1915, passa a empenhar-se no Jornalismo
militante, sua atividade jornalística chama a atenção não só pela qualidade do
texto, como também, pelo trabalho de pesquisa cultural. Gramsci acreditava que
toda revolução deveria ser precedida por um trabalho de difusão de ideologias
para que o povo aprendesse e tivesse consciência do que poderia ser mudado. Tanto que em
1919, quando a Itália passava por problemas sociais, ele e um grupo de
intelectuais publicaram o jornal L’ordine
Nuovo que significa A nova ordem,
esse periódico pretendia ser tanto um instrumento de investigação cultural
quanto um órgão de luta política.
Embora, já fosse integrante do PSI, Gramsci
não concordava, diretamente, com as principais correntes ideológicas do partido:
os marximalistas e os reformistas. Os
marximalistas acreditavam que a
revolução proletária se daria, naturalmente, através do desenvolvimento
econômico que aumentaria as diferenças, entre as classes sociais e causaria um
colapso no capitalismo. E que, enquanto isso, caberia ao proletariado fortalecer
suas organizações e esperar o grande dia. Já
os reformistas, aceitavam as propostas da classe dominante, mas faziam
divulgação dos seus ideais, acreditavam que, um dia, o socialismo chegaria pela
própria necessidade da sociedade. Diante deste dualismo, Gramsci não se sentiu à
vontade e propôs uma Associação Socialista da Cultura, que iria, segundo ele,
completar a frente da luta operária, mas o partido não aceitou e Gramsci montou, com seus simpatizantes o Clube de Vida Moral, que fazia debates
para instruir moral e, culturalmente os jovens socialistas.
Em 1921, o congresso do PSI, Gramsci foi o
líder da ala radical e formou o Partido
Comunista Italiano, onde foi secretário geral e deputado e onde fundou o
jornal L’Unitá. Neste momento a
ditadura fascista estava fortalecida e pouco tempo depois, o terrorismo se
inicia e os participantes da oposição foram cassados e presos. Gramsci foi preso
em 1926, e condenado a 20 anos de prisão.
As palavras de Gramsci causavam impacto,
tanto que durante o processo que o levou à prisão, um promotor chegou a afirmar
: “Devemos inutilizar por vinte anos esse cérebro perigoso”. Mal sabia ele que
os principais escritos de Gramsci foram feitos, justamente, na prisão (Cadernos
do Cárcere). Foi feito com dificuldades já que ele foi submetido a um regime
rigoroso, com restrição de leituras e só podendo escrever cartas e notas.
Em 1933, os sintomas da tuberculose já
estavam evidentes, e para não levarem a culpa pela sua morte, as autoridades
fascistas libertaram Gramsci três dias antes de sua morte, já em 1937.
Vale salientar que a atualidade de Gramsci se
deve, entre outras coisas, à publicação de seus escritos póstumos. Em 1947, é
publicada a primeira edição das Cartas do
Cárcere, tendo um enorme sucesso nos meios culturais. Gramsci é um pensador que nos permite estudá-lo em duas fases; a
primeira mais idealista e direcionada, que vai até meados de 1920, na qual
Gramsci trata dos problema mais próximos da sua realidade, como a exploração do
camponês sulino pelos latifundiários e nortistas, a chamada teoria meridional e
a dos conselhos de fábrica. Já a Segunda fase, que vai de 1920 até sua morte,
mostra um Gramsci mais consciente da realidade de seu país, disposto a estudá-lo
e lutar por uma maior liberdade intelectual. É nessa fase, que ele desenvolve as
teorias do Estado Ampliado, Ocidente Versus Oriente, Moderno Príncipe e o Papel do
Intelectual.
Devido a sua origem sulina, Gramsci estava
mais familiarizado com os problemas daquela região. Foi, talvez, por isso. O
primeiro a reconhecer e escrever sobre a situação camponesa de todo país,
principalmente, a situação dos
camponeses sulistas que sofriam com a expropriação da terra pelos latifundiários
e a exploração das indústrias do norte. Por isso, Gramsci propôs a união dos
camponeses com os intelectuais na criação de uma cooperativa que não só
resistiria à exploração do norte como, também, competiria com as indústrias de
lá.
Os Conselhos de Fábrica, defendidos por
Gramsci, podem ser chamados de “embrião” do partido político defendido por ele.
Gramsci era contra os sindicatos, por achar que estes não só tratam de
trabalhadores específicos, o que fragmenta a classe operária, mas, também, por
se deterem a questões salariais, ou seja, tratarem a força de trabalho como
capital. Já os Conselhos de Fábrica,
são compostos por um representante de cada setor da fábrica, trata o
trabalhador como produtor, unidos em prol de melhorias coletivas. Ele acredita
que o Estado Socialista deveria ser formado por vários conselhos de fábrica num
conselho executivo central.
TEORIAS
Teoria Ampliada do Estado:
Para Gramsci, o Estado é dividido em dois
segmentos: Sociedade política (que compreende os aparelhos de coerção sob o
controle das burocracias executivas e policial-militar) e Sociedade civil (que é
o conjunto de organizações responsáveis pela elaboração e/ou difusão de
ideologias e compreende o sistema escolar, as igrejas, os partidos políticos, os
sindicatos, os meios de comunicação, etc.).
Gramsci acreditava que a “mudança” não
poderia acontecer do “alto para baixo”. O socialismo só aconteceria de uma forma
gradual e com a mobilização da sociedade civil, já que ela difunde a ideologia.
Esse trabalho deve ser feito “transformando” a ideologia das massas. É a chamada
crise da hegemonia, sendo possível, apenas, nas sociedades mais complexas, com
alto grau de participação política organizada. Daí, o grande papel dos
intelectuais.
Oriente X Ocidente:
Gramsci procurou responder a causa do
fracasso da revolução socialista, nos países ocidentais. Ele concluiu que isso
se deveu às diferenças socio-culturais existentes entre esses países, pois, nos
países orientais havia o predomínio do Estado-coerção, o que exigiu uma
estratégia frontal, no qual Gramsci denominou: Guerra de movimento ou revolução popular.
Que consiste na conquista do poder pela força, sendo necessário, nos países
orientais, porque, lá, a sociedade civil era fraca, com reduzida influência
sobre as massas. Já nos países ocidentais, a estratégia era diferente, ao
contrário do que acontecia nos países orientais, nos ocidentais, a sociedade
civil era forte, com elevada influência sobre as massas, reduzindo, a quase
zero, a probabilidade das massas pegarem em armas para conquistar o poder. Dessa
forma, era necessária uma revolução
passiva ou Guerra de posições que é uma complexa luta por espaços e posições
dentro do “aparelho” político, um movimento de recuos e avanços na conquista de
cargos e alianças - o popular “comer pelas beiradas”- na missão de transformar a
classe dirigente em classe dominante para que a própria massa a destitua do poder.
Moderno Príncipe:
Em sua teoria do partido político de classe
operária, Gramsci se inspira em O
Príncipe de Maquiavel, a esse partido, Gramsci dá o nome de Moderno Príncipe. Agente da vontade
coletiva transformadora, não pode ser mais encarnado por um indivíduo. Nas
sociedades mais modernas, as funções que Maquiavel atribuiu a uma pessoa
singular, cabe a um organismo social, o partido político. A tarefa do Moderno Príncipe é superar os resíduos
corporativos e juntar todos os segmentos da sociedade para a formação de uma
vontade coletiva nacional-popular, ou seja, de um grau de consciência capaz de
permitir uma iniciativa política.
O
Papel do Intelectual: Sem uma nova cultura, as classes subalternas
continuarão sofrendo passivamente a hegemonia das velhas classes dominantes e
não poderão se elevar à condição de classes dirigentes. Direção política, é,
também, direção ideológica. Fazendo com que se crie uma nova cultura (nas
massas), o Moderno Príncipe estará
criando as condições para a hegemonia das classes subalternas, e sua vitória na
guerra de posições pelo socialismo.
Daí, a importância, também, do intelectual na construção do partido
político.
Para Gramsci, os intelectuais se detêm às sua
bases acadêmicas sem de fato conhecer as massas e sua cultura, por isso, são
incapazes de apreender as reais necessidades da população. Dessa forma, criando,
apenas, culturas superficiais, tornando quase impossível à massa o conhecimento
de sua real condição política e a aceitação de uma nova ideologia – aí, está a
necessidade e importância de se mesclar os intelectuais e os “pobres mortais”
deste país.
CRÍTICA
Gramsci, mesmo com suas complexas teorias não
ficou isento de críticas; o interessante é que as críticas nunca lhe foram
dirigidas como um todo, mas por fases, épocas de sua vida. Uma delas, quando
ainda estava em sua fase de maturação, é sobre seu caráter idealista que, na
época, afastou-o de uma análise mais detalhada das transformações econômicas por
que passava seu tempo. Seu Marxismo juvenil revelava-se impermeável à
compreensão profunda da importância do momento econômico e não o fez enxergar
algumas manobras políticas necessárias. O seu radicalismo do tudo ou nada o
aproximou, perigosamente, da criticada passividade Maximalista.
A outra crítica a Gramsci é de Lênin, ao seu
otimismo exagerado sobre a instauração da social-democracia na Itália, que
julgava não precisar de muitos esforços. Lênin, ao contrário, acreditava ser
necessário conhecer bem o inimigo para vencê-lo, inclusive, aliados mesmo que
incertos e provisórios.
Outra é de não distinguir gnosicamente entre
ciência e ideologia, entre conhecimento objetivo e consciência interessada,
transformando todo conhecimento, até mesmo, o de ciências naturais em expressão
de uma subjetividade de classe ou de grupo; ele equivale a uma objetivação
histórica-social e objetiva natural, mostrando que não superou, plenamente, a
teoria hegeniana, na qual, “toda realidade é espírito”.
E a que consideramos mais importante, feita
pelo cientista político e psicanalista João Rêgo, que trata da extinção do
Estado-coerção, absorvido pelo Estado-ético (sociedade civil), mas, esta era
parte integrante do Estado ampliado, logo, não se pode falar de extinção do
Estado, mas em uma reestruturação do Estado onde uma das partes foi atrofiada. E
acrescenta: “Não estaria Gramsci incorrendo num erro fatal que perpassa todo o
acervo do pensamento político socialista (e, portanto, também, pré-marxista) que
é de superestimar a figura do homem como o bom sauvage rousseauniano, em vez de uma
visão mais realista, ao nosso ver, do homem hobbesiano o homem é lobo do homem. Não seria o
Estado-ético, apenas, conseqüência da projeção desse tipo ideal de homem? E,
portanto, uma sociedade capaz de ser viável, apenas, na hipótese remota de ser
composta por anjos e não por homens?”
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