sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013


Equador hoje, Argentina amanhã?

O Equador e a Argentina, apesar do passado colonial espanhol comum, têm tradição e cultura históricas peculiares. A Argentina foi pólo de um vice-reinado e teve forte influência imigrante europeia em torno de seu principal porto. O Equador, por sua vez, sempre dependeu dos avanços que vinham de centros como Caracas e Bogotá. Sua população é de raiz essencialmente indígena, pouco mesclada com o europeu. Um é austral, o outro, andino. A lista podia estender-se por muitos parágrafos. Mas o que queria destacar aqui é que, no que diz respeito a lideranças autoritárias, que cada vez mais exercem seu poder sobre a imprensa, os dois países possuem fortes semelhanças.

Nesses dias, aqui em Quito, tenho tido uma espécie de sentimento antecipatório com relação à Argentina. Abro os jornais, vejo a TV e digo para mim mesma: se a Cristina Kirchner continuar em sua campanha contra a imprensa independente, o futuro será isso aqui. Por “isso aqui”, entenda-se: jornais de oposição que não conseguem fazer oposição por temerem pressões, autocensura, e uma rede imensa de meios que não param de elogiar e exaltar o presidente Rafael Correa. Cristina estatizou o papel-jornal, aprovou uma lei para democratizar os meios de comunicação para lá de polêmica e usa verba oficial para favorecer meios aliados. Correa também se apoia no uso selecionado de dinheiro público para veículos alinhados, mas foi muito além, montou um aparato de comunicação gigantesco, com expropriações de emissoras de TV e condenações contra jornalistas.



Hoje, caminhando pelo centro histórico de Quito, comprei um jornal popular super-governista que, em sua capa do caderno de Esportes trazia nada menos que… uma entrevista com Correa. A foto, essa aí de cima, mostrava o presidente bastante soltinho cabeceando uma bola. Nas imagens internas, super-sorridente e usando a camiseta verde que identifica a sua coalizão, a Aliança PAIS.

O repórter que assina a matéria é uma vergonha para a profissão de um modo geral. Sua abertura diz: “Rafael Correa se relaxa para a entrevista, que na verdade se converte em uma amena conversa. Se trata de um esportista nato, bom conversador, com sentido de humor, direto, franco, sem poses, e uma linguagem acessível às pessoas, o seu povo, que serve desde sua infância como escoteiro”. As perguntas levantam a bola do presidente o tempo todo, como conquistava as garotas na escola, que memória tem para recordar-se de canções, seus livros, time de futebol e filmes preferidos.

Correa diz que vai radicalizar a campanha contra a imprensa, se re-reeleito no próximo domingo. Entre outras coisas, há uma lei de imprensa muito mais radical que a argentina na pauta de suas prioridades. Se Cristina está mesmo se inspirando nas avançadas do colega equatoriano, daqui a pouco a veremos dando dicas de moda no suplemento feminino do “Tiempo Argentino” ou algum outro meio governista. A América Latina não precisava desse retrocesso.




Perfil Sylvia Colombo é correspondente da Folha em Buenos Aires.
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Os defensores da ignorância

Os defensores da ignorância

Na semana passada o deputado Eric Cantor, líder da maioria na Câmara dos Deputados, fez o que seu gabinete nos informou que seria um discurso político importante.
E devemos ficar gratos por termos sido informados da importância do discurso. Não fosse por isso, uma simples leitura do discurso poderia ter sugerido que Cantor não estava propondo mais que uma seleção parca de ideias velhas e requentadas.

É verdade que ele tentou parecer interessado na discussão séria de políticas concretas. Mas não conseguiu, e não foi por acaso. O fato é que, hoje em dia, seu partido rejeita a simples ideia de aplicar evidências e pensamento crítico a questões políticas.

E não se trata de uma caricatura: no ano passado o Partido Republicano no Texas condenou explicitamente os esforços para ensinar "habilidades de pensamento crítico", porque, alegou, tais esforços "têm por finalidade contestar as ideias fixas dos estudantes e enfraquecer a autoridade parental".

Tão grande é a influência daqueles que podemos qualificar como defensores da ignorância que, até mesmo quando fez um discurso visando demonstrar sua abertura a ideias novas, Cantor sentiu-se obrigado a acenar para o grupo daqueles defensores, lançando um chamado pela suspensão completa do financiamento federal de pesquisas em ciências sociais.

Porque, com certeza, é perda de dinheiro tentar entender a sociedade que queremos mudar.
Quer outros exemplos da turminha da ignorância em ação? Comecemos pela saúde, uma área na qual Cantor tentou não soar anti-intelectual; ele se derramou em elogios às pesquisas médicas, logo antes de criticar o apoio federal às ciências sociais. (Por falar nisso, de quanto dinheiro estamos falando? Bem, o orçamento inteiro da Fundação Nacional de Ciência para as ciências sociais e econômicas equivale a espantosos 0,01% do déficit orçamentário.)

Mas o apoio de Cantor às pesquisas médicas é curiosamente limitado. Ele é a favor do desenvolvimento de novos tratamentos, mas ele e seus colegas se opõem terminantemente às "pesquisas de eficácia comparativa", que procuram determinar a eficácia desses novos tratamentos.

O que eles temem, é claro, é que as pessoas que administram o Medicare e outros programas governamentais possam usar os resultados dessas pesquisas para determinar pelo quê se dispõem a pagar.
Ao invés disso, os defensores da ignorância querem converter o Medicare num sistema de vales-saúde e deixar que as pessoas individualmente tomem decisões sobre seus tratamentos.

Mas, mesmo que você ache isso boa ideia (não é), como é que as pessoas podem fazer boas escolhas médicas, se assegurarmos que elas não tenham ideia dos benefícios para a saúde podem esperar receber com os tratamentos que escolheram?

Mesmo assim, o desejo de perpetuar a ignorância em questões médicas não é nada, comparado ao desejo de acabar com as pesquisas climáticas, área na qual colegas de Cantor --especialmente em seu Estado natal, a Virgínia-- vêm desencadeando furiosas caças às bruxas contra cientistas que encontram evidências que desagradam a eles.

É verdade que a Virgínia finalmente concordou em estudar o perigo crescente da inundação de áreas costeiras; Norfolk é uma das cidades americanas mais vulneráveis às mudanças climáticas. Mas republicanos no Legislativo estadual proibiram especificamente o uso das palavras "elevação do nível do mar".

E há muitos outros exemplos, como, por exemplo, o modo como republicanos na Câmara dos Deputados tentaram suprimir um relatório do Serviço de Pesquisas do Congresso colocando em dúvida os efeitos mágicos que a redução dos impostos cobrados dos ricos supostamente teria sobre o crescimento da economia.

Ações como essas têm efeitos colaterais importantes? Bem, pense nas discussões dolorosas sobre política de armas de fogo que se seguiram ao massacre de Newtown. Seria útil para essas discussões se tivéssemos bom domínio dos fatos relativos às armas de fogo e à violência.

Mas não temos, porque nos anos 1990 políticos conservadores, agindo em nome da Associação Nacional de Rifles, pressionaram agências federais para que fosse suspensa praticamente qualquer pesquisa sobre o assunto. A ignorância proposital tem efeitos.

Neste momento as convenções dos analistas pedem que eu diga algo para mostrar minha imparcialidade, algo do tipo "os democratas também fazem isso". Mas, embora democratas, já que são humanos, com frequência fazem uma leitura seletiva de provas e optam por acreditar em coisas que os fazem sentir-se bem, não existe entre eles nada equivalente à hostilidade ativa dos republicanos contra a coleta de evidências, em primeiro lugar.

A verdade é que a divisão entre os partidos nos EUA é muito mais profunda do que até mesmo os pessimistas geralmente se dispõem a admitir. Os partidos não estão divididos apenas em relação a valores e visões políticas, estão divididos em relação à epistemologia. Um lado acredita, pelo menos em princípio, em deixar que suas posições políticas sejam moldadas pelos fatos. O outro lado acredita em suprimir os fatos quando estes contradizem suas crenças fixas.

Em sua tirada final ao deixar o Departamento de Estado, Hillary Rodham Clinton comentou a respeito de seus críticos republicanos: "Eles simplesmente se negam a viver num mundo baseado em provas". Ela estava aludindo especificamente à controvérsia em torno de Benghazi, mas o que disse se aplica de modo muito mais amplo. Não obstante toda a falação sobre reformar e reinventar o Partido Republicano, os defensores da ignorância ainda dominam com firmeza o coração e a cabeça do partido.


Tradução de CLARA ALLAIN

 
Paul Krugman Paul Krugman é prêmio Nobel de Economia (2008), colunista do jornal "The New York Times" e professor na Universidade Princeton (EUA). Um dos mais renomados economistas da atualidade, é autor ou editor de 20 livros e tem mais de 200 artigos científicos publicados.

PMDB vai usar propaganda para exaltar governo 'Dilma e Temer'

PMDB vai usar propaganda para exaltar governo 'Dilma e Temer' 

 

No ar, Dilma & Temer O PMDB vai usar seu programa de TV no horário partidário, dia 28, para exaltar feitos do governo "Dilma e Temer" e reafirmar o "compromisso" com a presidente. Sob artilharia de Lula e do PSB, o partido quer mostrar força: ressaltará o fato de ter a Vice-Presidência e comandar Câmara e Senado --com direito a falas de Renan Calheiros e Henrique Alves. Por fim, ensaiará discurso social: Temer dirá que Dilma e ele cumprirão promessa de erradicar a miséria nos próximos dois anos.


Fechando... Em conversas recentes com ministros, Dilma Rousseff se disse disposta a abafar planos de aliados que ensaiam migrar para outros projetos políticos. Nas palavras de um interlocutor, a presidente quer "cortar a asa'' do PSB, que integra a base, mas ameaça lançar Eduardo Campos em 2014.
...o cerco O Planalto monitora conversas de PDT e PR com Campos e Aécio Neves (PSDB), outro potencial adversário de Dilma. Auxiliares defendem acomodação dessas siglas na reforma ministerial para evitar a debandada.


Vacina Aliados do governador de Pernambuco apontam que, ao tomar a iniciativa de tornar públicas irregularidades em sua pasta e as medidas que adotou para contê-las, Fernando Bezerra (Integração) está se antecipando a uma esperada devassa nos ministérios da cota socialista, tramada por governistas.


RSVP A propósito, Eduardo Campos recebeu convite para o evento que lançará o novo partido de Marina Silva, também presidenciável, amanhã em Brasília.


Carga pesada Porta-voz dos dissidentes pedetistas e crítico à medida provisória dos Portos, o deputado Paulinho da Força (PDT-SP) afirma que o projeto só beneficia os "amigos do governo". "Como só pode disputar quem tem terreno, ganham pessoas como Gilberto Miranda e Eike Batista", fustiga.


Prévia Antes de iniciar o road-show internacional para apresentar projetos de infraestrutura a investidores, Gleisi Hoffmann (Casa Civil), Antonio Patriota (Relações Exteriores) e Bernardo Figueiredo (Empresa de Logística) expõem o plano segunda-feira a embaixadores estrangeiros no Itamaraty.


Companheiro 1 Lula abrirá, no dia 27, a primeira reunião do novo comando nacional da CUT, em hotel do centro de São Paulo. O petista fará uma saudação inicial aos 130 dirigentes da central e discorrerá sobre as cenas política e econômica do país.


Companheiro 2 O evento é preparativo para a Marcha dos Trabalhadores a Brasília, durante a qual sindicalistas cobrarão de Dilma Rousseff o cumprimento das promessas de campanha.


Todos por um Geraldo Alckmin convidou os 70 deputados da bancada paulista na Câmara para café da manhã no Bandeirantes na próxima terça-feira. O governador pedirá aos congressistas que votem em bloco nas medidas provisórias dos royalties e do comércio eletrônico.


In pectore Do advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, sobre a sucessão de Bento 16: "Como a indicação do papa pode priorizar um negro e latino-americano, o escolhido poderia ser o Joaquim Barbosa. Seria bom para o Supremo e bom para a Igreja".


Codinome O advogado da União Jefferson Carús Guedes, ex-vice-presidente jurídico dos Correios e alvo de processo disciplinar sob acusação de envolvimento nos desvios da Operação Porto Seguro, se referia ao ex-diretor da ANA Paulo Vieira, em e-mails analisados pela comissão de sindicância da AGU, como "Paulo Grana".

*
TIROTEIO
 
Haddad tenta vender um conto de fadas, mas a realidade é que há intensa distribuição de cargos e verbas para a base aliada.
DE FLORIANO PESARO, líder do PSDB, sobre artigo em que o secretário João Antonio (Relações Governamentais) prega nova relação com os vereadores.


*
CONTRAPONTO

 
Patrulha da moda 
Recém-empossado presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PDE) desembarcou em Roma em 2005 para o enterro do papa João Paulo 2º. Na recepção do hotel, foi cercado pelos repórteres brasileiros. Sem hesitar, chamou um grupo de jornalistas para ir ao seu quarto:
--Vocês me ajudam a escolher a roupa para amanhã?
O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), fingiu não saber da "consultoria" ao vê-lo na cerimônia:
--Presidente, o senhor está muito alinhado!
--A gente tem bom gosto, né, Renan? -- respondeu o presidente da Câmara, todo prosa, sem notar a ironia.
Com FÁBIO ZAMBELI e ANDRÉIA SADI


 
Eduardo Knapp/Folhapress Vera Magalhães é editora do Painel. Na Folha desde 1997, já foi repórter do Painel em Brasília, editora do caderno 'Poder' e repórter especial.

Após virar vereador de SP, Aurélio Miguel multiplicou bens

Após virar vereador de SP, Aurélio Miguel multiplicou bens




O campeão olímpico Aurélio Miguel multiplicou seu patrimônio desde que assumiu o cargo de vereador em São Paulo, em 2005, pelo PR.


Quando foi candidato a vereador pela primeira vez, em 2004, Miguel declarava ter, entre outros bens, quatro imóveis --um patrimônio, segundo ele, de R$ 870 mil (R$ 1,4 milhão em valores corrigidos pela inflação).


Já em 2012, passou, segundo o Ministério Público, a ter 25 imóveis registrados em nome dele ou de suas empresas. Os imóveis estão estimados em R$ 25 milhões --a avaliação é feita com base no valor do metro quadrado da região.


Nessa conta, não entram outros bens, como uma lancha e ao menos 17 carros, como uma Cherokee 2012 e um Opel, 1951.
Editoria de Arte/Folhapress



O crescimento mais expressivo do patrimônio do parlamentar ocorreu a partir dos anos de 2008 e 2009, época em que presidiu a CPI do IPTU na Câmara Municipal. Miguel, segundo investigações do Ministério Público, é acusado de cobrar propina de shoppings ligados ao grupo Brookfield para omitir irregularidades no relatório final da CPI. Ele nega as acusações.
Segundo depoimentos dados ao Ministério Público, ele teria recebido o pagamento em dinheiro vivo, entregue em carro-forte. Testemunhas dizem que as propinas chegavam a R$ 640 mil.
Ao menos oito imóveis adquiridos por Miguel após essa data foram pagos em dinheiro vivo, segundo documentos obtidos pela Folha em cartórios.

Aurélio Miguel

 
 
 
Imóvel em nome de empresa do vereador Aurélio Miguel, no Morumbi, em São Paulo; em 2004, ele declarou patrimônio de R$ 1,4 milhão(valores corrigidos); hoje, é de R$ 25 milhões
Como vereador, seu salário era de R$ 9.288 até 2012 --neste ano, passou a R$ 15.031.
Miguel afirma que o crescimento de seu patrimônio se deve a herança e compra e venda de imóveis.


DECLARAÇÕES

 
Em seu nome, o ex-judoca tem 12 imóveis que valem cerca de R$ 11,7 milhões. Apenas seis deles foram declarados à Justiça Eleitoral em 2012.


Nessa declaração, ele omitiu quatro terrenos que possui em Ilhabela, no litoral norte, uma casa no Jardim América (zona oeste) e uma casa no Morumbi, onde mora. Todos em seu nome.
Já à Receita Federal, ele declarou esses 12 imóveis, além de suas duas empresas: Aurélio Miguel Administração de Bens e Inter Sports.


Essas duas empresas têm outros 13 imóveis, adquiridos a partir de 2008, avaliados em mais de R$ 12,7 milhões.


Entre os imóveis de suas empresas há quatro casas no Morumbi avaliadas em cerca de R$ 5,3 milhões e quatro terrenos em Cotia.


Perícia feita a pedido do Ministério Público aponta que os 12 imóveis em nome do vereador são compatíveis com sua renda. Mas o parlamentar não conseguiu explicar aos promotores como adquiriu os outros 13 imóveis em nome das empresas.
Por isso, ele passou a ser investigado pelo Gaeco (grupo do Ministério Público especializado em crime organizado) por lavagem de dinheiro.


Miguel começou a ser investigado em junho de 2012 pela Promotoria após Daniela Gonzalez, ex-executiva da BGE, empresa do grupo Brookfield, relatar à Folha o pagamento de propina a ele e a Hussain Aref Saab, ex-diretor da prefeitura, para obter alvarás para shoppings.



ROGÉRIO PAGNAN
EVANDRO SPINELLI
DE SÃO PAULO

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

A “Outra História do mensalão” é um sucesso !


Publicado em 13/02/2013

A “Outra História do
mensalão” é um sucesso !


O STF não perde por esperar ...

O Conversa Afiada reproduz e-mail que recebeu de Willian Novaes da Geração Editorial, a mesma editora que lançou a Privataria Tucana, do Amaury, pela blogosfera.



Pessoal,

Tudo bem?

Os 8 mil exemplares da primeira edição do livro A Outra Historia do Mensalão já estão comprometidos com uma parte dos clientes da Geração Editorial. Mesmo em pleno Carnaval, a editora foi obrigada a aumentar a tiragem inicial em mais 10 mil exemplares, necessários para atender a enorme procura. Até as 12h desta Quarta-feira de Cinzas, 30% dos 10 mil extras também foram reservados para mais uma parte dos parceiros comerciais da editora.

A mais nova polêmica traz as contradições do suposto “maior julgamento” da história da Justiça brasileira. A tiragem de 18 mil exemplares é um número considerado alto para o mercado editorial brasileiro.

A editora mais polêmica do Brasil apostou em A Outra Historia do Mensalão – As contradições de julgamento político, de autoria do jornalista Paulo Moreira Leite, para os leitores tirarem a sua própria conclusão sobre o julgamento mais midiático realizado pelo Supremo Tribunal Federal. A obra tem o prefácio do respeitado jornalista e colunista da Folha de S. Paulo, Janio de Freitas.

ALGUMAS PERSONALIDES COMENTARAM SOBRE O LIVRO:

“O bom jornalismo é o alimento da democracia, o mau jornalismo o seu veneno. Os textos de Paulo Moreira Leite sobre o julgamento sintetizam aquilo que o jornalismo tem de melhor: fidelidade aos fatos, capacidade de organizar e relacionar informações, coragem de raciocinar com a própria cabeça, enfrentando a manada. E talento, que não faz mal a ninguém. O futuro agradece.”

JORGE FURTADO, cineasta premiado, dirigiu O Homem que Copiava e Saneamento Básico — o filme

“Explicando as decisões do STE a partir da conjuntura política do país, Paulo Moreira Leite desempenhou um relevante papel como consciência crítica. Lembrou que o combate à corrupção é fundamental, mas que deve ser sopesado com a presunção de inocência e o do Estado de Direito.”, PEDRO ESTAVAM SERRANO, Professor de Direito Constitucional na Faculdade de Direito da PUC de São Paulo

“Ao discutir o julgamento, Paulo Moreira Leite ilumina um dos temas mais caros à democracia: a liberdade política. Ele o faz de forma clara, profunda, brilhante, demolidora. O livro revela o arbítrio judicial e mostra como um jornalista se transformou em operário das liberdades.” – LUIZ MOREIRA, Doutor em Direito pela UFMG, Conselheiro Nacional do Ministério Publico entre 2010 e 2012


Abc

Willian

Transmissão da Globo relaciona Cuiabá a "selva" e "caju"



Transmissão da Globo relaciona Cuiabá a "selva" e "caju"

Quem assistiu à apresentação da Mangueira teve a impressão de que a Capital de MT fica em meio a uma selva

Desfile da Estação Primeira da Mangueira, que recebeu R$ 3,6 milhões para homenagear Cuiabá
DA REDAÇÃO
Se a intenção da Estação Primeira de Mangueira era homenagear Cuiabá e “vender”, por meio de seu desfile a Marquês de Sapucaí, seus potenciais turístico, econômico e cultural, o tiro pode ter saído pela culatra.

Quem assistiu a apresentação da escola de samba pela TV Globo, teve a impressão de que a Capital mato-grossense fica em meio a uma selva, repleta de animais “pantaneiros”, como jacarés, onças e cobras gigantes.

Mais: o que era para ser ponto alto – e que justificassem o investimento de R$ 3,6 milhões feito pela Prefeitura de Cuiabá – acabou se transformando em uma salada de frases feitas, quase banais, superficialismo e equívocos históricos.
"Apesar de toda a bizarrice, sem dúvida o pagamento de R$ 3,6 milhões para bancar a homenagem, feito com o dinheiro do povo, serviu para alguma coisa"

A cultura cuiabana também foi “judiada” durante a transmissão global. Resumiu-se a uma demonstração pobre e sem sentido, que distorceu elementos básicos e jogou no chão aquilo que deveria ser um trunfo.

Logo no início da transmissão, os primeiros tropeços. Um dos repórteres da TV Globo perguntou a uma integrante da "ala dos Bandeirantes" se ela conhecia Cuiabá. A mulher disse que não. O repórter insistiu: “Como a senhora imagina Cuiabá?”.

- Ah, eu imagino um lugar assim... Uma selva!

Na sequência, outro repórter perguntou a outra passista, da "ala do Ouro", quais eram as riquezas de Cuiabá.

A resposta foi outra “tragédia”:

- As riquezas são a natureza, o ouro e o caju!

Os locutores da TV Globo, Glenda Kozlowski e Luis Roberto, também colaboraram, em muito, para ridicularizar Cuiabá. Nitidamente, ambos não se deram ao trabalho de pesquisar, o mínimo, sobre a cidade homenageada, sua cultura e tradições.

Assim que a câmera deu um close a uma das alas, em que "peixinhos fofinhos" faziam parte das fantasias, Glenda Coloski soltou:

- Olha o pacu, gente!!! Cuidado com o pacu!!! Quem come a cabeça do pacu se casa e não sai de Cuiabá!

Em outro ponto, a mesma Glenda emendou a “pérola”, dizendo que as índias ofereciam o peixe para seduzir os bandeirantes. Pacu como “arma” de sedução? Socorro!!!

A mesma locutora disse, também, de modo confuso, que Cuiabá "é a cidade que eles (os bandeirantes) pensavam ter encontrado, o Eldorado".

"Noiva fantasma"


Outro ponto digno de registro foi quando a TV deu destaque para uma ala, com “noivas fantasmas”, em que caveiras de crânios humanos, imensas, ficavam suspensas e adornavam as fantasias.

De novo, a locutora da TV Globo foi cruel.

- Noivas fantasmas! Se você encontrar uma mulher vestida de branco nas ruas de Cuiabá, muito cuidado.

A exemplo desse “desfile” de falta de conhecimento histórico e cultural, a Capital mato-grossense também foi brindada, cantada e homenageada com outras referências rasas e desconexas.

O locutor Luiz Roberto, por exemplo, disse que a “boneca de pano é tradição do artesanato cuiabano”, assim como a panela de barro.

A coisa poderia ter sido pior, caso a escola de samba não tivesse atrasado seu desfile - fato que deixou de fora da transmissão televisiva outras tantas alas e carros alegóricos.

Apesar de toda a bizarrice, sem dúvida o pagamento de R$ 3,6 milhões para bancar a homenagem, feito com o dinheiro do povo, serviu para alguma coisa: para animar a trupe do ex-prefeito Chico Galindo que, muito provavelmente, se esbaldou com as comidas, bebidas e mordomias do camarote reservado às autoridades ditas cuiabanas.

Sem dúvida, um Carnaval inesquecível...
 
 
12.02.2013 | 07h49 - Atualizado em 12.02.2013 | 16h51

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

A influência dos EUA no impeachment de Fernando Lugo

A influência dos EUA no impeachment de Fernando Lugo




Na véspera do julgamento do impeachment que o destituiu da presidência do Paraguai em 22 de junho do ano passado, Fernando Lugo reuniu-se com o embaixador norte-americano James Thessin na capital Assunção. A reunião estava marcada havia muito tempo, bem antes da matança de Curuguaty – uma operação policial de reintegração de posse na região de Curuguaty que deixou 17 mortos no dia 15 de junho de 2012, e foi usada como argumento pelo Congresso para depor Lugo uma semana depois.


Seguindo o protocolo, Thessin convidou Lugo para a recepção de celebração ao 4 de julho, data da independência americana, a ser realizada na embaixada, que toma um quarteirão inteiro no centro da capital paraguaia. “Mas você está me convidando para eu ir como presidente ou como cidadão?”, indagou Lugo. “Como presidente, é claro”, tranquilizou-o Thessin.


Lugo já não era mais o presidente do Paraguai no dia 4 de julho e não compareceu à cerimônia, que teve direito à execução dos dois hinos nacionais, refrescos e tira-gostos. A data marcava o fim de uma semana de trabalho duro em relação à deposição do ex-bispo da presidência e à ascensão do seu vice, o liberal Federico Franco, ao poder. Um trabalho que envolveu mais do que diplomatas americanos e foi realizado silenciosamente – os EUA só se pronunciaram sobre o Paraguai 20 dias depois do impeachment.



paraguai


No dia anterior à festa, 3 de julho, a missão da Organização dos Estados Americanos (OEA) liderada pelo secretário-geral José Miguel Insulza tinha deixado o país. Durante três dias o grupo havia se reunido com representantes de todos os partidos políticos, da Igreja, da Corte Suprema, com empresários, jornalistas, donos de veículos de comunicação, lideranças indígenas, com o atual presidente Federico Franco e seu chanceler e até com o próprio Lugo.

Insulza levou representantes “de vários grupos geográficos” para integrar a missão, conforme descreveu em seu relatório. Nenhum, porém, da América do Sul. O grupo que foi ao Paraguai para averiguar a crise era composto pela embaixatriz dos EUA na OEA, Carmen Lomellin; pelo embaixador do Canadá, Allan Culham; do Haiti, Duly Brutus; de Honduras, Leónidas Rosa Bautista; e do México, Joel Hernández.

A missão da OEA se posicionou no sentido contrário ao Mercosul e Unasul, que suspenderam o Paraguai por considerar que o impeachement representava uma ruptura no jovem processo democrático paraguaio pelo tempo exíguo concedido à defesa do presidente no julgamento – menos de 17 horas. Insulza defendeu a legitimidade do processo-relâmpago, que estaria respaldado pela Constituição paraguaia, e minimizou as críticas feitas pelas organizações regionais: “É natural que a situação que ocorreu no Paraguai tenha gerado reações negativas”, escreveu em seu relatório, “mas isso não é exatamente uma novidade no hemisfério”. Também sugeriu que a OEA deveria aumentar sua presença no país até as eleições presidenciais, marcadas para abril de 2013. “Em 10 meses o Paraguai vai ter eleito autoridades com completa legitimidade democrática”, concluiu.

No dia seguinte à publicação do informe da OEA, o governo de Barack Obama declarou seu apoio a Federico Franco. “Não há razões para que o Paraguai seja suspenso da OEA”, afirmou a secretária-adjunta de Estado para as Américas, Roberta Jacobson, em uma conferência de imprensa. “O que realmente queremos é focar no futuro”, disse. “Vejo o Paraguai como uma forma de nos unirmos na região para apoiar a democracia paraguaia e não como um tema que exacerbe as divisões”. “Então não foi um golpe de Estado?” – questionou um jornalista. “Não vou responder a essa pergunta”, retrucou, irritada, a secretária.
As sanções do Mercosul e Unasul também foram rechaçadas pela Câmara de Comércio Paraguaio-Americana (Pamcham), entidade que reúne empresários americanos e paraguaios alinhados à política exterior dos EUA. Antes ainda da posição oficial americana, a Pancham qualificou como “inaceitável” a intromissão do Mercosul e da Unasul. O presidente honorário da PamCham é o mesmo embaixador James Thessin.

Lugo não estava errado ao indagar o embaixador americano sobre seu futuro quando convidado para o 4 de julho. Afinal, o apoio dos EUA é fundamental para o futuro de qualquer governo naquele país. As reticiências dos americanos em relação à sua presidência foram bem descritas pela antecessora de Thessin na embaixada, Liliana Ayalde, que escreveu em telegrama enviado em 7 de dezembro de 2009, e vazado pelo Wikileaks: “Temos sido cuidadosos em expressar nosso apoio público às instituições democráticas do Paraguai – não a Lugo pessoalmente”.

Ayalde, hoje à frente da seção Caribe, América Central e Cuba do Departamento do Estado, foi ainda mais clara ao afirmar que havia prevenido o ex-bispo sobre os “benefícios” de manter uma relação próxima com os EUA, “sem permitir que ele use o apoio da embaixada como um salva-vidas”.

A influência americana sobre o Paraguai não era apenas uma questão diplomática. Através de doações administradas pela USAID de mais de US$ 100 milhões (em cinco anos) a empresas, ONGs e órgãos governamentais dificílimos de monitorar, os americanos garantiram a proximidade com diversas esferas de poder no Paraguai. “Atores políticos de todos os espectros nos procuram para ouvir conselhos”, resumiu a ex-embaixadora Ayalde no mesmo relatório confidencial. “E a nossa influência aqui é muito maior do que as nossas pegadas”, pontuou.

O treinamento das forças de segurança paraguaias estavam entre os principais programas financiados pela USAID. Entre 2005 e 2010, mais de mil militares e policiais foram treinados – a maioria em 2009, ano seguinte à posse de Lugo – e dali saíram alguns comandantes das Forças Armadas nomeados por Franco quando assumiu o poder. A Polícia Nacional foi a responsável pela operação que resultou na matança de Curuguaty. O Ministério Público, que baseou-se exclusivamente em depoimentos de policiais para atribuir aos camponeses a culpa pelo massacre, e a Corte Suprema, que negou dois recursos movidos pela defesa de Lugo, também foram contemplados com programas financiados pela USAID.

Um dos mais influentes defensores dos interesses americanos no Paraguai é Michael Eschleman, um americano cinquentão com uma longa história no país, que dirige o Programa de Democracia da USAID. Em 1985, ainda sob a ditadura do general Alfredo Stroessner, Eschleman foi voluntário do Corpo da Paz (Peace Corps), uma agência governamental que leva jovens voluntários do primeiro mundo a países pobres e já foi acusada de infiltrar espiões. Eschleman chegou a gerente de treinamento e diretor da Peace Corps antes de assumir o comando da USAID no Paraguai. O programa mais importante de sua gestão é o Threshold – Umbral em espanhol –, que recebeu recursos de mais de US$ 60 milhões nos últimos 5 anos.

Documentos obtidos pela Agência Pública através da Lei de Acesso à Informação dos EUA revelam que antes mesmo da votação do impeachment o diretor de Democracia da USAID já planejava seus passos com o novo governo: “Comecei a fazer reuniões internas para avaliar e traçar uma estratégia sobre a melhor maneira de manter o andamento dos programas no novo governo”, explicou Eschleman em um email às 17h20 do fatídico 22 de junho para a direção da Millenium Challenge Corporation (MCC), agência financiadora ligada ao Congresso americano. Observando que “às seis horas, Franco já deve ser presidente”, Eschleman escreveu: “Provavelmente vai levar alguns dias para saber quem serão os novos ministros e como podemos abordar a nova liderança para garantir não só estabilidade nos programas, mas a habilidade para caminhar adiante”. Mas, ressaltou, a mudança governamental significava “boas novas” para a USAID: “Franco e a sua equipe conhecem muito bem o programa Umbral porque trabalharam próximos a nós nos últimos anos”.

Duas horas depois o diretor da USAID enviou outro email contando que, logo após o discurso de posse, o novo presidente nomeou novos ministros. Mais “boas novas”: “Tanto o ministro do Interior (Carmelo Caballero) quanto o novo Chefe da Polícia (Aldo Pastore) trabalharam conosco no programa Umbral, e são pessoas que chamaríamos de aliados!” Depois, sobre o ministro de Finanças, Manuel Ferreira Brusquetti, e o chefe de Gabinete de Franco, Martín Burt, celebrou: “Conhecem e respeitam a USAID, e trabalharam conosco no passado”.

Em outro email, enviado no dia 9 de julho, Eschleman explicou o silêncio da missão americana durante as primeiras semanas pós-destituição: por causa do “processo de impeachment, da troca de administração e da atenção internacional aos eventos locais, a USAID tem mantido um low profile”, escreveu. E acrescentou: “A embaixada está esperando o relatório da delegação da OEA ao Conselho Permanente. Até lá, os funcionários da USAID não participam de reuniões ou eventos públicos com membros do governo”.
Mas, da parte do MCC, o receio de que houvesse alguma reviravolta política já havia se dissipado. Foi assim que a diretora da MCC escreveu para Eschleman no dia 5 de julho: “A poeira já abaixou um pouco? Nós conversamos sobre o Paraguai aqui e não achamos que há ações para serem tomadas em relação a preocupações de elegibilidade”.

 
O massacre de Curuguaty


No dia 22 de março de 2012, em cerimônia no Palácio Nacional, outro diretor do programa Umbral, o americano Matthew Langhenry, recebeu uma medalha ao mérito da Polícia Nacional Paraguaia as mãos de seu comandante, Paulino Rojas, que durante um ano e meio trabalhou próximo à USAID no programa Umbral. Rojas, treinado pelo FBI em um curso na Virgínia em 1998, colocou com cuidado a medalha no peito do colega americano. “Doamos mais de US$ 2 milhões em equipamentos para a polícia, mas o mais importante é que juntos reformamos a grade curricular da academia policial, juntos reformamos o colégio de suboficiais”, discursou Langhenry, suando de calor. Com a medalha no peito, encerrou: “Juntos escrevemos o primeiro manual de uso da força para a Polícia Nacional no Paraguai e juntos reformamos o regulamento disciplinar”, concluiu com seu sotaque carregado.

Três meses depois, Paulino Rojas daria a ordem de reintegração de posse que levou à matança de Curuguaty – e à deposição de Lugo. Foi uma desocupação polêmica, para dizer o mínimo, pois o terreno ocupado pelos sem-terra não tinha título de propriedade válido, o que motivou o Instituto de Terras do Paraguai a pedir diversas vezes a suspensão da reintegração.

Mesmo dentro da Polícia Nacional muitos queriam adiar a ação por temer o conflito – incluindo o chefe policial da região, Ariovaldo Sanauria, subalterno direto de Rojas, que insistiu com que a ação fosse postergada. “O chefe de Operações Especiais, Comissário Erven Lovera, abatido, pedia aos gritos aos seus superiores que essa operação não se realizasse”, contou à imprensa outro policial, o Comissário Principal Carlos Núñez Agüero. Lovera foi o primeiro policial a ser morto no conflito. Era irmão do chefe de segurança pessoal do então presidente Fernando Lugo. Nenhum desses temores foram informados ao ministro do Interior de Lugo, Carlos Filizolla, pelo comandante Paulino Rojas, segundo o próprio ex-ministro.

O fato é que nas primeiras horas do dia 15 de junho 324 oficiais cercaram 70 camponeses – o tamanho desproporcional da força tampouco foi informado ao ministro do interior. A operação policial foi marcada pela violência e abusos, conforme apurou a organização Plataforma de Estudio e Investigación de Conflictos Campesinos (PEICC). Seis policiais e 11 camponeses morreram. Dezenas de trabalhadores rurais foram presos sumariamente apenas por estarem no local e há relatos de torturas, suspeitas de execuções e sinais de alteração da cena do crime.

Entre os policiais do Grupo de Operações Especiais (GEO) que encabeçaram a desocupação do terreno, pelo menos dois foram treinados pelos Estados Unidos: em março de 2009, Cesar Horacio Medina e Nelson Dario Zaracho Ocampos participaram de um treinamento do programa de Assistência a Antiterrorismo do Departamento de Estado americano em Assunção, segundo documentos vazados pelo Wikileaks.


O programa Umbral


O Umbral é o coração da estratégia americana para o Paraguai. Um estudo realizado pelo instituto paraguaio Base-IS demonstrou que o volume de recursos destinado ao Umbral só é comparável à primeira década da ditadura de Alfredo Stroessner – que durou 35 anos e recebeu o apoio decisivo do governo dos EUA assim como as demais ditaduras da região.

Financiado pela Corporação do Desafio do Milênio (MCC, em inglês) e lançado em 2006, o programa é uma espécie de “ajuda preliminar” a países pobres para melhorar seus índices “transparência”, “justiça” e “liberdade econômica” antes de aceder ao grande bolo da MCC: os programas Compactos, com verbas de US$ 100 milhões a US$ 700 milhões. Projetos desenvolvidos com o Ministério Público, a Controladoria Geral, a Corte Suprema, o Congresso, a Receita Federal e o Ministério das Finanças, Indústria e Comércio receberam US$ 34,6 milhões até 2009.

Os resultados, porém, foram pífios, de acordo com uma auditoria da própria USAID, que produziu um documento mostrando que muitos objetivos não foram atingidos e o governo de Nicanor Duarte Frutos não estava lá muito interessado em persegui-los. Um laboratório forense financiado pelos EUA permaneceu sem uso por dois anos; um programa para aumentar a transparência e o monitoramento das atividades do Congresso foi abandonado “por causa da falta de vontade política”; o investimento nas atividades da alfândega ficou restrito à capital Assunção, enquanto o contrabando continuava a todo vapor na fronteira; dez dos doze barcos doados para patrulhamento fronteiriço não entraram em operação; um novo sistema de carteiras de identidade e passaportes, implementado e financiado pela USAID, acabou gerando polêmica com a acusação de favorecimento de uma empresa americana no processo de licitação.

Mesmo assim, o governo dos EUA assinou um novo contrato de assistência com o Paraguai no valor de US$ 34 milhões em 2009, já sob o governo de Fernando Lugo. Na cerimônia de lançamento do Umbral 2, a então embaixadora Liliana Ayalde não titubeou ao declarar à imprensa que todas as metas e objetivos da primeira fase haviam sido cumpridos, e que a segunda fase buscava “afiançar a democracia e consolidar as instituições do Estado paraguaio”.

Na divisão dos recursos do Umbral 2, a Polícia Nacional recebeu a maior verba, US$ 9,4 milhões; seguida pelo Ministério Público: US$ 5,5 milhões, além dos US$ 6,2 milhões que havia recebido na primeira fase do programa. A Corte Suprema recebeu US$ 5 milhões em ambas as fases.

Foi esse mesmo Ministério Público, na pessoa do promotor Jalil Rachid, que sem ouvir nenhum camponês concluiu que eram eles os responsáveis pelo massacre, encarcerando 14 sem terra e emitindo mandato de prisão contra outros 54 – alguns nem estavam presentes durante a reintegração de posse. A conclusão de Rachid foi respaldada pelo Promotor Geral do Estado, Javier Díaz Veron. Em setembro, Verón também emitiu um parecer recomendando à Suprema Corte que negasse o segundo pedido de inconstitucionalidade feito pelos advogados de Lugo por causa do tempo exíguo dado à defesa durante o impeachment. A Suprema Corte rejeitou o recurso.

Fazendo a corte em Nova York

Ao negar o recurso, em 20 de setembro, o presidente da Corte e relator do processo,Victor Nunez, fez uma avaliação quase surreal: “Como se trata de um procedimento que tecnicamente não é jurisdicional, as garantias próprias do processo judicial, embora possam ser aplicáveis, não o são de maneira absoluta, mas parcial, com o objetivo de garantir o devido processo e o direito de defesa do acusado”. Os advogados de Lugo tiveram exatas 17 horas para preparar a sua defesa, e duas horas para defendê-lo no Congresso.
Seis meses antes, Nunez e os demais membros da Suprema Corte haviam se reunido com o diretor da USAID para América Latina e Caribe, Mark Feierstein, para falart sobre o programa Umbral. Feierstein declarou ao final do encontro: “Estamos trabalhando com a Corte Suprema contra a corrupção e para que o sistema judicial seja mais efetivo e mais eficiente para o povo paraguaio”, afirmou. “Reconhecemos o êxito alcançado, é um exemplo para outros países”.

Não era bem isso que dizia a embaixadora Liliana Ayalde nos despachos enviados em 2009 ao Departamento de Estado. Na mesma época em que destinava 2,5 milhões de dólares à Corte no programa Umbral, em um despacho diplomático Ayalde afirmava que a Corte, “ampla e corretamente”, era vista como corrupta, mais focada “em interesses políticos e pessoais do que em questões legais”. E escreveu: “A interferência política é a norma; a administração da Justiça se tornou tão distorcida, que os cidadãos perderam a confiança na instituição”.

“O controle político da Suprema Corte é crucial para garantir impunidade dos crimes cometidos por políticos hábeis. Ter amigos na Suprema Corte é ouro puro”, escreveu no despacho, em 25 de agosto de 2009. “A presidência e vice-presidência da Corte são fundamentais para garantir o controle político, e os Colorados (oposição a Lugo) controlam esses cargos desde 2004. Nos últimos cinco anos, também passaram a controlar a Câmara Constitucional da Corte”.

Três anos antes do julgamento político de Lugo, ela escreveu: “Esta câmara é famosa por tomar decisões controversas e arbitrárias. (….) Para os aliados de Lugo, obter controle da câmara é fundamental para prevenir um possível impeachment”.

Mas não era Lugo que detinha o controle da Corte, como mostraram os fatos. Um mês depois de emitir seu voto, o presidente da Corte, Victor Nunez, participou da primeira comitiva internacional do novo presidente Federico Franco – que se dirigiu à Assembleia Geral da ONU, em Nova York.

Foi a estreia de Franco no cenário internacional, na qual ele participou, bem como todos os chefes de Estado, de um jantar oficial promovido pelo anfitrião Barack Obama no pomposo hotel Waldorf Astoria. Na ocasião, Franco teve oportunidade de tirar uma foto ao lado do mandatário americano, junto com sua esposa e a primeira-dama Michelle Obama, elegantemente apropriados para a gala da noite. Desde então – se passaram já quatro meses – a mesma foto orgulhosamente estampa a abertura de o site oficial da presidência do Paraguai.

*Colaborou Jeremy Bigwood


 Por Natalia Viana*

Agência Pública

Paraguai

05.02.2013 09:21

‘É um teólogo brilhante’, diz CNBB


‘É um teólogo brilhante’, diz CNBB


A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) disse na tarde desta segunda-feira 11 de fevereiro, em nota, estar supresa com a renúncia do papa Bento XVI, anunciada pela manhã. Segundo a organização, Joseph Ratzinger é um “teólogo brilhante”, que entrará para a história como o “Papa do amor”.


Foto: ©AFP / Vincenzo Pinto
Foto: ©AFP / Vincenzo Pinto


A CNBB afirma acolher “com amor filial as razões apresentadas por Sua Santidade, sinal de sua humildade e grandeza, que caracterizaram os oito anos de seu pontificado”.

“O curto período de seu pontificado foi suficiente para ajudar a Igreja a intensificar a busca da unidade dos cristãos e das religiões através de um eficaz diálogo ecumênico e inter-religioso”, diz a nota.


A CNBB agradeceu ainda o pontífice pela atenção dada ao Brasil. A primeira visita intercontinental de Bento XVI foi ao País em 2007. Além disso, o Vaticano escolheu o Rio de Janeiro para sediar a Jornada Mundial da Juventude, em julho.

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil-CNBB recebe com surpresa, como todo o mundo, o anúncio feito pelo Santo Padre Bento XVI de sua renúncia à Sé de Pedro, que ficará vacante a partir do dia 28 de fevereiro próximo. Acolhemos com amor filial as razões apresentadas por Sua Santidade, sinal de sua humildade e grandeza, que caracterizaram os oito anos de seu pontificado.
Teólogo brilhante, Bento XVI entrará para a história como o “Papa do amor” e o “Papa do Deus Pequeno”, que fez do Reino de Deus e da Igreja a razão de sua vida e de seu ministério. O curto período de seu pontificado foi suficiente para ajudar a Igreja a intensificar a busca da unidade dos cristãos e das religiões através de um eficaz diálogo ecumênico e inter-religioso, bem como para chamar a atenção do mundo para a necessidade de voltar-se ao Deus criador e Senhor da vida.

A CNBB é grata a Sua Santidade pelo carinho e apreço que sempre manifestou para com a Igreja no Brasil. A sua primeira visita intercontinental, feita ao nosso País em 2007, para inaugurar a V Conferência Geral do Episcopado da América Latina e do Caribe, e, também, a escolha do Rio de Janeiro para sediar a Jornada Mundial da Juventude, no próximo mês de julho, são uma prova do quanto trazia no coração o povo brasileiro.

Agradecemos a Deus o dom do ministério de Sua Santidade Bento XVI a quem continuaremos unidos na comunhão fraterna, assegurando-lhe nossas preces.

Conclamamos a Igreja no Brasil a acompanhar com oração e serenidade o legítimo processo de eleição do sucessor de Bento XVI. Confiamos na assistência do Espírito Santo e na proteção de Nossa Senhora Aparecida, neste momento singular da vida da Igreja de Cristo.



Dom Raymundo Damasceno Assis
Arcebispo de Aparecida
Presidente da CNBB
Dom José Belisário da Silva
Arcebispo de São Luís
Vice-presidente da CNBB
Dom Leonardo Ulrich Steiner
Bispo Auxiliar de Brasília
Secretário Geral da CNBB






Carta Capital


Se não está fácil para o papa…


Se não está fácil para o papa…


Vamos combinar: não está fácil ser papa hoje em dia. Quando Joseph Ratzinger foi escolhido para comandar a Santa Sé, em 2005, as ferramentas que mudariam os canais de interlocução entre o público e as autoridades eram ainda uma novidade. Havia internet, havia uma cobertura intensa do conclave, havia todo tipo de análise de todos os calibres sobre o futuro da Igreja. Mas os impactos das novas tecnologias ainda não faziam estragos (não tão rapidamente) como acontece nos dias de hoje.


Foto: ©AFP / Vincenzo Pinto
Foto: ©AFP / Vincenzo Pinto


Bento 16, sem o carisma do antecessor João Paulo II, tinha nas costas não apenas a missão de estancar a hemorragia de fiéis num tempo de convicções seculares, mas também a de atrair um público jovem cada vez mais conectado, cada vez mais ativo, cada vez menos interessado em verdades inabaláveis. Não foi por outro motivo que o papa aderiu ao Twitter, um púlpito bem diferente daquele a que todos os antecessores, a começar por São Pedro apóstolo, haviam reinado.


Oficialmente, a renúncia de Joseph Ratzinger é explicada pela saúde debilitada. Há relatos sobre ordens médicas para que evitasse grandes deslocamentos para se poupar. Em livro de memórias, ele já havia manifestado o desejo de deixar o pontificado caso a saúde limitasse sua missão. É uma explicação plausível, dada a idade avançada do sumo pontífice (ele tem 85 anos). Mas há também de se levar em conta a discrepância entre a missão herdada e a capacidade de Bento 16 conduzi-la.


Os canais de interlocução que ora eram anunciados como pontes entre a Igreja e os novos tempos são as mesmas a expor as fraturas de uma instituição combalida. Os inúmeros, incontáveis escândalos sexuais e outros desvios protagonizados por quem detém, supostamente, o monopólio da fé, da bondade e da caridade hoje não permanecem mais de dois minutos debaixo do tapete. As reações também. Não à toa, em seu pronunciamento, o pontífice se mostrou assustado com a velocidade das mudanças pelo mundo. Enquanto isso, a Igreja muda seu percurso na velocidade de um transatlântico: os avós de hoje rezavam a missa em latim, mas os avós de amanhã seguem repetindo orações prontas, como cordeiros passivos em celebrações dominicais de ritos engessados nos quais a lógica e o confronto, tão caros mundo afora, parecem ignorados entre as paredes de uma igreja.


O resultado é que, embora  conectados a ferramentas atualizadas de comunicação, o papa e sua Igreja seguiram com um velho discurso construído em dogmas e tabus pouco atualizados do século primeiro até aqui. Num mundo que pede igualdade de oportunidades, direitos e deveres, o papa discorria sobre os “perigos” do casamento gay e condenava os avanços que tornaram a humanidade melhor e mais livre em relação a tempos remotos (como a camisinha, a pílula e o desapego às instituições familiares e patriarcais). Não que este anacronismo estivesse ausente em postulados recentes; é que, antes, as tecnologias não permitiam tal assimilação.


Como o papa relutante de Nanni Moretti, que em seu Habemus Papam parecia ter previsto uma fábula sóbre o vácuo de liderança do mundo atual, Bento 16 pode ter se dado conta de que sua posição não o tornou imune ao escrutínio humano. Num passado recente, a aura em torno de uma autoridade e seu circulo de asseclas eram barreira protetora diante das demandas e manifestações populares. De longe, nem sempre era possível avistar o tamanho de possíveis encrencas. O exercício de poder era (é?) um exercício de autoilusão até que alguém da rua gritasse que o rei estava nu. Hoje este grito parte de todos os lados e a distância entre reis e súditos praticamente inexiste. Os canais de interlocução criam reações automáticas, assustadoramente rápidas até para nativos digitais. Em outras palavras: aqui se paga o que se fala, o que se escreve. E nunca foi tão fácil descobrir o quanto um líder é amado ou odiado fora do púlpito.
Se em algum momento o papa Bento 16 se perguntou “que rei sou eu”, a internet e outros canais não o deixaram sem respostas, estas que faltam na Bíblia e sobram nas ruas.




Matheus Pichonelli

11.02.2013 10:34

A chegada dos novos tempos



A chegada dos novos tempos


Há uma frase fundamental de Abraham Lincoln: “Nada é mais poderoso do que uma ideia cujo tempo chegou”.

Vale para o Brasil de hoje, para a política e para a economia.


Democracia é o ambiente mais favorável às políticas de inclusão, ao acesso dos diversos grupos aos benefícios da cidadania. São processos lentos, porém irreversíveis. E foi assim com o Brasil, depois de um século 20 amplamente dominado por regimes autoritários ou modelos políticos anacrônicos e excludentes.
A transição custou caro ao país. Perdeu-se o rumo nos anos 80, a economia foi vítima de uma inflação renitente, nos anos 90 a carência de informações permitiu uma gigantesca transferência de recursos da economia real e das políticas sociais para juros.


Mas, aos trancos e barrancos, foi-se firmando o rumo para a estabilidade política e para a consolidação de novos valores democráticos. A política brasileira caminha para se encontrar no centro.


***
No plano das eleições presidenciais, por exemplo, o jogo encaminha-se para três personagens forjados na democracia: Dilma Rousseff, pleiteando a reeleição; Aécio Neves, como candidato do PSDB; e Eduardo Campos, como candidato do PSB.


Dos três, o único a radicalizar o discurso tem sido Aécio, muito mais por pressão da mídia do eixo Rio-São Paulo – e dos maus conselhos de FHC – do que por vocação própria. Quando cair em si e voltar a ser Aécio, poderá aspirar a recuperar o espaço perdido para Eduardo Campos.


Os três candidatos empunham bandeiras de gestão e praticam uma política de alianças e coalizão partidária.
O candidato que representava o obscurantismo mais atroz – José Serra – já faz parte de um passado que, espera-se, não volte mais.


***
Seja no estado de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Pernambuco, Ceará, Sergipe e na União, governantes de todos os partidos já aderem a um conjunto de novos valores políticos altamente democráticos:


- O primado da gestão para controle dos atos de Estado. Esse modelo será aprofundado com a Lei da Transparência.


- Políticas sociais inclusivas. Recorde-se que, no choque de gestão de Minas, a ponta mais vulnerável era a questão social. O mesmo ocorria em São Paulo. A consagração de políticas como o Bolsa Família mostrou que o atendimento das demandas dos mais pobres é ponto central de legitimação das políticas públicas.
- As parcerias Eduardo Campos-Lula, em Pernambuco, Anastasia-Dilma, em Minas, Alckmin-Haddad-Dilma, em São Paulo, enterra o clima de ódio que marcou a política brasileira pós-redemocratização, polarizada entre o PSDB e o PT paulistas, os dois principais agentes da política nacional.


-Cooperação federativa. Hoje em dia há uma boa estruturação de associações de secretários estaduais das diversas áreas, associação de municípios, conferências nacionais, permitindo troca de experiências e aprofundamento do modelo federativo.


Anos atrás, o PT era conhecido por sua intransigência, incapacidade de montar alianças ou abrir mão de poder nos locais em que governava. Na presidência, Lula – e, agora, Dilma – montaram um governo mais amplo do que o partido, consolidando um espaço socialdemocrata que ficou vago quando FHC afastou o partido das ruas.


***
No PSDB, governantes totalmente infensos a qualquer política de alianças e de distribuição de poder, ouvindo a sociedade civil  – como Geraldo Alckmin – começam a rever posição.

A nova mídia – 1


Ponto central dessas mudanças é o crescimento da Internet e dos diversos polos de irradiação de opinião. A democracia se acelera quando os diversos grupos de interesse têm acesso aos mesmos meios de disseminação das suas bandeiras. No pós-redemocratização, o jogo político foi dominado pela presença avassaladora das mídias paulista e carioca pautando as políticas públicas e definindo um conjunto restrito de atores.

A nova mídia – 2


Nesse jogo, apenas o mercado financeiro tinha voz permanente. Nem industriais, nem ruralistas, muito menos movimentos sociais, estados fora do eixo, tinham voz. Temas centrais de modernização – como inovação, gestão, políticas de segurança – passaram ao largo das grandes discussões midiáticas. E criaram-se imagens totalmente dissociadas da realidade, como a de um José Serra gestor competente.
 
A nova mídia – 3


A Internet passa a ser a mesma plataforma por onda transitam tanto as informações dos grandes grupos como dos blogs mais distantes. Mas um bom argumento tem condições de se espalhar através de redes sociais, permitindo o surgimento de novos veículos fazendo o contraponto. Muitos se assustam com o caos atual da Internet, com milhares de informações circulando, grupos se digladiando.

A nova mídia – 4


Os cientistas sociais sustentam que o excesso de manifestações políticas, longe de prenunciar o caos, na verdade ampliam a democracia, ao permitir um debate mais rico e com mais personagens. O mesmo acontecerá com a Internet. A grande quantidade de informações permite o aparecimento de novos veículos, cujo diferencial será o de agregar as informações existentes e fomentar a participação dos leitores.

A nova mídia – 5


Hoje em dia, um fato só se torna notícia depois que um jornalista entrevista um personagem e escreve ao seu modo. Nesse modelo de produção, o jornal (e o jornalista) são não apenas os intermediários, mas os donos da informação. Eles podem selecionar quais informações dar, quais as que jogará fora, quais aqueles que irá valorizar. No novo tempo, as informações serão construídas colaborativamente.

A nova mídia – 6


Grupos especializados montarão suas redes, para discussões amplas; governos, empresas, ONGs, associações, se prepararão para gerar suas próprias notícias. Não haverá mais a necessidade de se ouvir uma fonte e colocar uma declaração em aspas – muitas vezes fora do contexto – para levantar a opinião de uma empresa sobre determinado tema. A posição estará em notícias publicadas em seus próprios sites.



Luis Nassif



12.02.2013 11:01

Pressões políticas podem ter influenciado Bento XVI


Pressões políticas podem ter influenciado Bento XVI


O anúncio da renúncia do Papa Bento XVI nesta segunda-feira 11 causou surpresa, mas não pode ser considerado um movimento tão inesperado. Em meio a um mandato marcado por tensões com outros líderes religiosos, novos casos de pedofilia envolvendo clérigos e a demanda por uma Igreja Católica mais aberta, Joseph Ratzinger vivia sob constante pressão. Algo que tornou-se mais evidente em delicados escândalos, como o do mordomo mandado para a prisão por revelar documentos que deixavam claro o jogo de poder nos corredores do Vaticano.


Papa Bento XVI no dia 25 de novembro de 2012 na Basílica de São Pedro. Foto: ©AFP / Vincenzo Pinto
Papa Bento XVI no dia 25 de novembro de 2012 na Basílica de São Pedro. Foto: ©AFP / Vincenzo Pinto


Em uma carta, Ratzinger afirma ter refletido repetidamente até concluir não ter mais “forças, devido à idade avançada (…) para exercer adequadamente o ministério petrino”. Embora isso não seja novidade, uma vez que ele assumiu o posto aos 77 anos, em 19 de Abril de 2005, o pontífice não mencionou nos últimos anos nenhuma doença grave que poderia afasta-lo de suas funções. Realizou recentemente, inclusive, um longo discurso a cardeais sem grandes problemas.


É preciso, então, avaliar as forças políticas do Vaticano, um monastério absolutista sobre o qual o Papa tem mandato vitalício e controla sozinho os poderes Judiciário, Executivo e Legislativo. Sem mencionar alguns aspectos das diretrizes econômicas do Estado independente cravado no centro da Itália. É, portanto, um cargo sujeito a pressões de todos os tipos. Algo que pode ter contribuído para a renúncia.


“O Papa vinha enfrentando problemas políticos entre os grupos [da Igreja]. Basta ver no ano passado quando o mordomo vazou documentos secretos. Tudo isso cria um conjunto de fatores políticos sérios que o desgastaram ainda mais na idade dele”, diz o teólogo Rafael Rodrigues da Silva, professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. “Logicamente, isso não vai aparecer de maneira oficial.”


O Vaticano, comenta o desembargador aposentado Walter Mairovitch, colunista de CartaCapital, é notório por guardar bem seus segredos. “No caso do mordomo, há várias notícias de um movimento contrário ao Papa e até um carta com uma ameaça de morte. Houve ainda o escândalo do Banco do Vaticano, em que se viu que o Papa tinha muita dificuldade de impor as regras mínimas da União Europeia contra a lavagem de dinheiro.”


Segundo Silva, a Igreja está rachada em três grupos: o que levou Ratzinger ao poder, um mais liberal e outro conservador, que figuram no aspecto político e econômico do Vaticano. “O caso dos vazamentos mostra claramente que há um grupo totalmente contrário ao Papa atual. E isso desgasta qualquer agente político.”






Foto: Hermenpaca/Flickr
Pressões políticas podem ter influenciado decisão do Papa. Foto: Hermenpaca/Flickr

Um desgaste capaz de fazê-lo tomar uma decisão quase sem precedentes na Igreja Católica. Bento XVI se tornará o primeiro Papa a renunciar nos últimos 600 anos. O último foi Gregório XII, que deixou o cargo em 1415. “Estou bem consciente de que este ministério, pela sua essência espiritual, deve ser cumprido não só com as obras e com as palavras, mas também e igualmente sofrendo e rezando. [...] É necessário também o vigor, quer do corpo, quer da mente; vigor este que, nos últimos meses, foi diminuindo de tal modo em mim que tenho de reconhecer a minha incapacidade para administrar bem o ministério que me foi confiado”, disse.


Na carta, Bento XVI afirma estar “consciente da gravidade deste ato, com plena liberdade” e define a decisão como de grande importância “para a vida da Igreja”. E de fato será. Os cardeais, que devem anunciar um substituto até março, não poderão ignorar que o secularismo vem ganhando espaço no mundo e que a sociedade espera mudanças no posicionamento da Igreja sobre temas como o uso de preservativos. “Quando ele diz que não tem plenas forças para continuar, poderia se esperar que a igreja teria uma posição rumo À modernidade, com um sucessor mais jovem”, aponta Maierovitch.


O papado de Bento XVI, diz Silva, foi uma transição ao João Paulo II e a renúncia indica que já cumpriu seu papel. O que abre espaço para as especulações sobre o seu substituto. Pela primeira vez, a Igreja Católica poderia ser chefiada por um não-europeu. Entre os nomes cotados estão o dos brasileiros dom Odilo Pedro Scherer, arcebipso de São Paulo, e João Braz de Aviz, do departamento de Congregações Religiosas do Vaticano. O argentino Leonardo Sandri, do departamento de Igrejas Ocidentais, é outro cotado.


As mudanças poderiam ocorrer também na condução da Igreja, que não enfrenta uma “revolução” desde o Concílio do Vaticano II, entre 1962 e 1965. À época, o Papa João XXIII e bispos de todo o mundo modernizaram a igreja para estancar a perda de fieis. Como resultado, as missas deixaram de ser rezadas em latim com o padre de costas para o público, para acontecerem no idioma local. “A expectativa é ter um sucessor que siga o caminho de abertura pelo Vaticano II, algo que Paulo II e Bento XVI representaram um retrocesso”, acredita Silva.




Gabriel Bonis


11.02.2013 14:47

Entenda como será a eleição do próximo papa




Entenda como será a eleição do próximo papa


Imagem de 16 de abril de 2005 mostra a capela Sistina pronta para o conclave que elegeu Joseph Ratzinger como o novo papa. Foto: Pierpaolo Cito / AFP


Imagem de 16 de abril de 2005 mostra a capela 
Sistina pronta para o conclave que elegeu Joseph Ratzinger como o novo papa. Foto: Pierpaolo Cito / AFP


A data de 28 de fevereiro, anunciada na segunda-feira 11 pelo papa Bento XVI como o dia em que renunciará ao cargo, não foi estabelecida de forma aleatória. A eleição para substituí-lo precisa ter início em, no máximo, 20 dias após a vacância do papado, como determina a Constituição do Vaticano, o que obriga os cardeais eleitores a se reunirem, e tomarem uma decisão, ainda em março. Assim, antes da Páscoa (que em 2013 ocorre em 31 de março), quando os cristãos celebram a ressurreição de Jesus Cristo, a Igreja Católica terá um novo líder.


As regras para a realização do conclave, a eleição do novo papa, foram estabelecidas e atualizadas na Constituição Apostólica, assinada por João Paulo II. Qualquer homem católico batizado pode ser escolhido como papa, mas apenas cardeais foram eleitos desde 1378. Participam da votação somente os cardeais com menos de 80 anos. Hoje há 117 eleitores aptos, 50 nomeados por João Paulo II e 67 por Bento XVI. A maioria (61) é da Europa. Há ainda 19 latino-americanos, 14 de Estados Unidos e Canadá, 11 africanos, 11 asiáticos e um da Oceania.


O processo eleitoral é coordenado por uma congregação formada pelo cardeal camerlengo, o administrador da propriedade e receita da Santa Sé, e por três cardeais assistentes. Desde 2007, o camerlengo é o italiano Tarcisio Bertone, ex-arcebispo de Gênova. Os assistentes são definidos por sorteio e têm “mandatos” de apenas três dias, sendo posteriormente substituídos após um novo sorteio. Essa comissão tem poder apenas para cuidar da eleição e tratar de assuntos urgentes, mas não pode tomar decisões de atribuição exclusiva do papa.


A Constituição Apostólica é uma admissão de que os cardeais não são santos. Há uma série de mecanismos e restrições para garantir a transparência do conclave e evitar fraudes ou influências indevidas sobre a votação.


Durante o conclave, os cardeais são obrigados a trajar a batina preta filetada e a faixa vermelha, com o solidéu, cruz peitoral e anel e devem-se manter em completo isolamento, não podendo trocar correspondência epistolar, telefônica ou por outros meios de comunicação com pessoas estranhas ao âmbito da eleição. Todas as pessoas que estarão no Vaticano durante a eleição, como os responsáveis por alimentação e limpeza, ou mesmo religiosos de nível inferior, estão proibidas de conversar com os cardeais.

As votações são administradas por nove cardeais também sorteados. Três são os “escrutinadores”, que contam os votos, três são os infirmarii, responsáveis por recolher os votos dos cardeais eventualmente doentes, e três são revisores da votação. Para o papa ser eleito, ele precisa de dois terços dos votos. No caso do sucessor de Bento XVI, serão necessários 78 votos (dois terços de 117). É na primeira votação que os cardeais descobrem quão favorito é cada um dos candidatos. “Até a primeira votação, você não sabe quem realmente tem força e quem não tem”, disse ao jornal norte-americano Chicago Tribune o arcebispo de Chicago, Francis George.


Caso não seja obtida a maioria de dois terços, os cardeais passam por um período de três dias nos quais devem realizar duas votações, uma pela manhã e outra à tarde, em busca de um consenso. Se não tiverem sucesso, os cardeais podem realizar mais três séries de sete votações, entremeadas por curtos períodos de “oração, de livre colóquio entre os votantes e de uma breve exortação espiritual”. Se ainda assim não houver consenso, realiza-se uma votação entre os dois cardeais mais votados.


A cada votação, as cédulas e as anotações dos cardeais são queimadas. Se o voto não tiver sucesso, a chaminé da Capela Sistina emitirá uma fumaça preta. Quando o nome do novo papa for definido, a chaminé soltará uma fumaça branca. Momentos depois, o protodiácono do Vaticano, atualmente o francês Jean-Louis Tauran, aparece na varanda central da Basílica de São Pedro para informar, com a frase habemus papam, que um novo papa foi escolhido e aceitou a nomeação. Após o anúncio, o novo papa é apresentado ao povo e dá a primeira bênção.


Carta Capital

 12.02.2013 13:18

Um líder no começo


Um líder no começo


E vem à tona, de súbito, um fato de 35 anos atrás. Uma entrevista de Luiz Inácio da Silva, mais popular como Lula, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema, então com 32 anos. Ali está a essência do pensamento de um operário que se tornaria presidente da República. A lucidez, a clareza, a coerência, a energia.

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Lucidez. “Sou dedo-duro para a oposição, comunista para o governo, subversivo para os patrões”


Volto ao presente. Telefona Cynara Menezes, valente jornalista da sucursal de Brasília. Acaba de inaugurar uma nova seção no seu blog, destinada a divulgar antigas entrevistas. Pergunta se conservo uma de minha autoria, aquela de Lula publicada pela IstoÉ de 1º de fevereiro de 1978. Não, não conservo. Diga-se que nada guardo da minha vida profissional, artigos, colunas, coleções de revistas e jornais que dirigi. Nem sei se tenho em casa algum exemplar dos meus livros.

Entra em cena outro valente, Dilico Covizzi, foi meu companheiro de trabalho em diversas ocasiões, a começar por Veja, na qualidade de peça fundamental do Departamento de Documentação da Editora Abril. Seguiu-me no Jornal da República e na IstoÉ. Pesquisador emérito, sabe à perfeição como e por que um arquivo não há de ser necrotério de documentos e informações. Hoje a exercer a profissão na qual se formou, Direito, ainda me atende quando preciso, e cabe a ele a tarefa de capturar aquela entrevista, capaz de levar um presidente da Fiesp, Mario Amato, a dizer: “Só falta agora o Mino namorar Lula”.

A bem da precisão, contei naquele dia em São Bernardo com a preciosa escolta de Bernardo Lerer, enésimo valente, e desta surtida falo no meu livro de iminente publicação pela Editora Record, O Brasil, desabusado na mistura de memória com ficção. Por isso, a entrevista tem dupla autoria, restou-me escrever a reportagem que a precede, um perfil da personagem, estampada na capa de IstoÉ. Dizia a chamada: “Lula e os Trabalhadores do Brasil”. Foi a primeira capa dedicada a quem, 24 anos depois, alcançaria a Presidência de todos os brasileiros, sem exclusão dos metalúrgicos de São Bernardo e Diadema.

O mergulho nas páginas de 35 anos atrás me fez bem, tenho todas as razões para me orgulhar daquela edição, daquela reportagem e daquela entrevista. Limito-me a reproduzir trechos desta. Bernardo e eu perguntamos: “Mas onde você está ideologicamente?” O entrevistado responde: “Digo de peito aberto que não tenho compromisso com ninguém e que o Sindicato de São Bernardo e Diadema é uma da poucas coisas independentes que existem nesta terra. Só tenho compromisso com os trabalhadores que me elegeram. No mais a gente é chamado de dedo-duro pela oposição, de comunista pelo governo e de subversivo pelos patrões”.

Insistimos. “E a ideologia, Lula, a ideologia?” E lá veio a resposta: “Para fazer um partido dos trabalhadores é preciso reunir os trabalhadores, discutir com os trabalhadores, fazer um programa que atenda às necessidades dos trabalhadores. Aí pode nascer um partido de baixo para cima”. Estávamos diante de um líder de visões agudas. Afirmava: “Existe, na categoria dos metalúrgicos, um pessoal preparado, que lê jornal e sabe das coisas. Mas a maioria não tem tempo de dar a bênção para os filhos”. E mais: “Eu tenho muito cuidado para movimentar esta classe trabalhadora ainda inconsciente, porque o retrocesso pode ser ainda maior”.

Nem por isso, tirava o time de campo. “Não devemos abandonar a reivindicação, se não conseguirmos o que queremos, vamos voltar à carga em 1979, e não se não conseguirmos em 1979… Não estou preocupado se o ano é eleitoral, os donos do poder é que em um momento como este estão preocupados. Por isso, acho que é hora de negociar, num nível bem alto (…) Quando eu digo negociar, é porque não existe poder de barganha. (…) No entanto, vejam como são as coisas, o movimento sindical está preocupado com o AI-5. A mim, o que incomoda é um artigo da Consolidação das Leis do Trabalho que não permite a dirigentes sindicais discordarem da política econômica, quem discorda pode ser cassado”.

“Proponho-me – declarava Lula –, não incentivar aos trabalhadores a fazerem greves, mas a prepará-los a entenderem o valor da greve.” Ele já compreendia a diferença entre consumidor e cidadão, e este é aquele que tem, exatamente, a consciência dos seus direitos e dos seus deveres. Pois é, a consciência da cidadania, atributo tão raro até hoje, 35 anos depois, em todos os níveis.

Enfim, o pensamento do futuro presidente, situação inimaginável então. “Em defesa do capital nacional, eu me aliaria a eles como brasileiro (referia-se aos empresários ‘de visão menos poluída’) como se estivesse cumprindo um dever para com meu país. Claro que pretenderia levar as minhas vantagens nesta aliança, mas acima de tudo estaria o interesse nacional.”




Mino Carta

Mino Carta é diretor de redação de CartaCapital. Fundou as revistas Quatro Rodas, Veja e CartaCapital. Foi diretor de Redação das revistas Senhor e IstoÉ. Criou a Edição de Esportes do jornal O Estado de S. Paulo, criou e dirigiu o Jornal da Tarde. redacao@cartacapital


Dez anos depois…



Dez anos depois…


Ninguém pode negar: o Brasil mudou para melhor. Dez anos de governos do PT proporcionaram profundas mudanças econômicas e sociais. A sociedade mudou. A desesperança dos anos 1990 foi transformada em otimismo e em uma nova pauta de desejos e exigências. Os governos do PT geraram também uma aglutinação oposicionista composta de forças liberais, de seitas conservadoras, de grupos rentistas, de famílias que controlam grandes meios de comunicação, de altos funcionários de carreiras de Estado e, por último e com menos importância, três ou quatro partidos políticos.



Em 1998, as classes de renda A, B e C somavam 53% da população brasileira. Hoje, somam 84%.  Foto: Agência Brasil
Em 1998, as classes de renda A, B e C somavam 53% da população brasileira. Hoje, somam 84%. Foto: Agência Brasil


As estatísticas econômicas e sociais são avassaladoras quando são comparados os governos do PSDB (1995-2002) com os governos de Lula-Dilma (2003-2012). Alguns poucos exemplos são suficientes para comprovar as diferenças.


No início dos anos 2000, pesquisas apontavam que o desemprego era um grande problema nacional. Em 2003, a taxa de desemprego era superior a 12%. Em 2012, foi de 5,5%. Em 1998, as classes de renda A, B e C somavam 53% da população brasileira. Hoje, somam 84%. O volume de vendas do mercado varejista praticamente dobrou de tamanho entre 2002 e 2012. Em 2002, somente 33,9 % dos domicílios possuíam máquina de lavar. Em 2011, este número aumentou para 51%. Em 2002, 86,6% dos domicílios possuíam geladeira; em 2011, saltou para 95,8%. E, certamente, milhões de brasileiros trocaram eletrodomésticos velhos por novos.


O emprego e o consumo levaram as classes de renda C e D às localidades onde vivem ou trabalham os ricos e aqueles que recebem altas rendas. Esse foi o momento em que os mais necessitados perceberam que não basta ter emprego. O emprego é essencial, mas é preciso ter transporte, saneamento, iluminação pública, moradias dignas, coleta de lixo, áreas de lazer etc… é preciso ter direito às cidades. Sob estas condições, indivíduos que já realizam o consumo (uma atividade privada) passaram a desejar o investimento (público) para todos.


Este é o desafio da década: manter o emprego, o crescimento da renda, e socializar a oferta de bem-estar. Essa é a nova utopia de grande parte da sociedade. Se o PT deseja continuar mudando e transformado o Brasil terá que abraçar essa utopia. O modelo de crescimento com geração de emprego e distribuição de renda, implementado nos últimos 10 anos, precisa incorporar no seu âmago a multiplicação do bem-estar social – que significa a socialização da oferta de serviços e equipamentos públicos de qualidade.


Não há qualquer projeto político alternativo ao projeto implementado pelo PT nesses últimos anos. A aglutinação oposicionista não tem projeto. Ela busca tão somente (o que não é pouco) aumentar a rejeição ao PT, a Lula e à presidente Dilma. Pode-se, por exemplo, criticar o governo por não permitir o aumento da gasolina e reduzir a capacidade de investimento da Petrobras, mas vale também o argumento de que o governo autorizou o aumento da gasolina e neutralizou a redução de tarifas de energia elétrica.


No segundo semestre de 2012, um colunista de rádio criticou a presidenta Dilma por fazer o movimento de redução dos juros. Dizia ele, em tom de sentença: “não é possível reduzir juros por decreto”. Mas, os juros baixaram. Recentemente, ele disse: “os juros no Brasil ainda são uns dos mais altos do mundo”. E, talvez sem perceber, logo em seguida proclamou em tom de concordância: “parte do mercado percebe a necessidade de os juros subirem porque a inflação está se acelerando”. É a prática do vale-tudo: dizer, desdizer e dizer novamente. A coerência não importa. O que importa é fazer oposição no programa de rádio diário.



A aglutinação oposicionista busca juntar um enorme entulho de rejeição ao governo, ao presidente Lula e ao PT. O objetivo é afogá-los nesse lixão. O lixo pode ser rotulado de corrupção, alianças espúrias (com velhos corruptos), incompetência, voluntarismo, autoritarismo, ingerência política em empresas estatais, enriquecimento ilícito, indicações políticas (e não técnicas) para cargos públicos, obras paralisadas, filas no SUS, desperdício de recursos públicos e possibilidade de racionamento de energia elétrica.


É neste ziguezague que a aglutinação oposicionista busca espalhar rejeição para um candidato qualquer tentar vencer as eleições presidenciais de 2014. Não importa o candidato, suas ideias, projetos etc. O que importa é interromper a história. Afinal, ela tem incomodado e muito.  A aglutinação oposicionista está contrariada porque perdeu ganhos financeiros, perdeu o monopólio de decidir grandes questões nacionais, não têm livre acesso aos corredores do Palácio do Planalto… e perdeu controle sobre o futuro. Não aceitam civilizadamente o resultado das urnas: afinal, estudaram nas melhores escolas, em universidades americanas, falam duas ou três línguas e tomaram toddynho na infância. Seu destino não poderia ser a oposição. Eles não aceitam não ocupar posições de comando. O caminho tem sido o do vale-tudo.


A aglutinação oposicionista não somente quer interromper a história. Eles querem apagá-la.  Aliás, nem consideram história o que aconteceu no Brasil nos últimos dez anos. Chamam o período de “tempos estranhos”. Um articulista de uma grande revista escreveu: “Lula será apenas outra má lembrança destes tempos estranhos”.




 


João Sicsú

Professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Foi diretor de Políticas e Estudos Macroeconômicos do IPEA entre 2007 e 2011.
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