sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Por ANTONIO OZAÍ DA SILVA
Docente na Universidade Estadual de Maringá, doutorando na Universidade de S. Paulo e autor de História das Tendências no Brasil (São Paulo, Proposta Editorial)
RESENHA
História do Marxismo no Brasil - Volume 5: Partidos e organizações dos anos 20 aos 60
Orgs.: Marcelo Ridenti e Daniel Aarão Reis Filho
Editora da UNICAMP
R$ 22,00 - 282 p.
Pedidos: alfarrabio@ieg.com.br
O Marxismo no Brasil: múltiplas trajetórias, utopias, decepções e contribuições
História do Marxismo no Brasil (Volume V), organizado por Marcelo Ridenti e Daniel Aarão Reis Filho, trata dos partidos e organizações dos anos 1920-1960. Nos seis capítulos que compõem O livro, aborda-se, de maneira sucinta, a história das esquerdas marxistas no Brasil: o Partido Comunista do Brasil (PCB), o trotskismo, o Partido Socialista Brasileiro (PSB), a Organização Revolucionária Marxista-Política Operária (ORM-POLOP) e a Ação Popular (AP).
Inicialmente, Marcos del Roio analisa a atuação dos comunistas, nas décadas de 1920-1940. Trata-se dos primeiros passos do Partido Comunista: as dificuldades objetivas e subjetivas em se firmar enquanto organização política autônoma dos trabalhadores; as debilidades teóricas, próprias da nossa exígua tradição marxista (ao contrário dos congêneres europeus – onde, em geral, os partidos comunistas surgiram de cisões da social-democracia –,o comunismo brasileiro deita raízes no anarquismo, com o partido se constituindo a partir da conversão de militantes libertários, influenciados pela Revolução Russa, ao bolchevismo); a interferência do movimento comunista internacional, através do Bureau Sul-Americano, que resultou no afastamento do grupo dirigente original (Astrogildo Pereira,Octávio Brandão e Cristiano Cordeiro), abortando os esforços, particularmente de Octávio Brandão, em formular uma teoria da revolução brasileira; e, as relações conflituosas com o positivismo, o liberalismo e o prestismo. O período analisado pelo autor abrange as origens, consolidação e o quase aniquilamento do Partido Comunista, vítima da onda repressiva durante o Estado Novo getulista.
Segundo a tradição egípcia, existiu uma ave mitológica que vivia por séculos e, mesmo queimada, ressurgia das cinzas. Esta ave maravilhosa é conhecida como Fênix. Seu nome passou a ser usado enquanto sinônimo de persistência, tenacidade, referência às pessoas e instituições que sobrevivem às mais duras provas. Assim foi o Partido Comunista em vários momentos da sua história. Nos idos dos anos 1940, renascido das cinzas, tal qual a Fênix, o partido cresce excepcionalmente, tornando-se um partido de massas, com considerável influência sobre a política brasileira. Este período, marcado pelos estertores do regime varguista, o final da II Guerra Mundial, e a reconquista da liberdade e da democracia no Brasil, termina com o golpe militar de 1964. Nesta fase o PCB conquistou a legalidade, e perdeu-a, cassado no clima da fria; teve inflexões à esquerda e à direita, oscilando entre uma política de colaboração e alianças de classes a uma retórica esquerdista e revolucionária para, nos anos 50, com a Declaração de Março, se definir pelo caminho pacífico da revolução brasileira. Todo este percurso tortuoso é analisado por Daniel Aarão Reis Filho.
Da aurora de todos os sonhos (a redemocratização do Brasil a partir de 1945), à longa noite sombria (iniciada com o despotismo militarista de 1964), o PCB se bateu entre reforma e revolução. Este é o mote deste segundo capítulo. É um período que, guardada as devidas proporções conjunturais e históricas, nutre semelhanças com o processo de lutas sociais de finais de anos 70 e inícios dos anos 1980, com a reconquista das liberdades democráticas, o crescimento do movimento sindical e popular e o surgimento de uma organização política dos trabalhadores, que se afirma como novidade, mas que também incorpora a herança histórica do passado pecebista e das esquerdas marxistas.
No terceiro capítulo, Dainis Karepovs e José Castilho Marques Neto resgatam a trajetória dos trotskistas brasileiros, das origens aos anos 1966. O trotskismo se caracterizou por historicamente se restringir a pequenos agrupamentos sem inserção de massas, em geral composto por intelectuais e estudantes. Contudo, o trotskismo também se caracteriza por sua radicalidade e capacidade de interpretar a realidade social brasileira. Segundo os autores, isto permitia aos trotskistas “observar e enunciar realidades que escapavam a outras organizações políticas contemporâneas.” O trotskismo contribuiu ainda para romper com o monolitismo do partido único, dando um caráter pluralista à historia do movimento operário e fornecendo chaves teóricas para a discussão dos impasses e derrotas dos projetos da esquerda. (pp. 103-04)
As raízes do trotskismo brasileiro estão nas polêmicas e enfrentamentos no seio do Partido Comunista da União Soviética e na III Internacional. A derrota de Leon Trotsky, o profeta assassinado, determinou a reconfiguração do movimento comunista internacional com a formação da Oposição Internacional de Esquerda e, posteriormente, a IV Internacional. É neste contexto que Mário Pedrosa e outros militantes assumem a tarefa de construir a alternativa trotskista no Brasil. Os autores analisam as contribuições e dificuldades desta primeira geração de trotskistas e das posteriores: suas formulações teóricas, a difícil convivência com os comunistas do tronco pecebista e seus embates internos, influenciados pela conjuntura nacional e pelas polêmicas no interior da IV Internacional.
Chegamos ao capítulo 4, escrito por Margarida Luiza de Matos Vieira. A autora estuda a contribuição do Partido Socialista Brasileiro, no período 1947-1965. um primeiro elemento que chama a atenção é que o PSB não se afirmava como um partido marxista, embora influenciado pelo pensamento de Karl Marx e de outros teóricos marxistas. O PCB reconhecia esta contribuição e se pretendia um espaço aberto a todos que desejassem lutar por uma sociedade fundada no socialismo e na liberdade. No PSB, mescla-se o socialismo democrático, desvinculado da tradição stalinista, com um socialismo inspirado no pensamento de Rosa Luxemburgo, e uma concepção liberal sobre o Estado e a sociedade.
Analisando o programa do PSB, sua prática política e sua trajetória, a autora conclui que o mesmo se constituiu num “partido-semente”, agitador de uma nova concepção política e cultural que deu base a um projeto de cidadania coletiva que, ao contrário dos projetos dos liberais orgânicos e mesmos dos comunistas, combinava as dimensões políticas e sociais da democracia.” (pp. 181-82)
Também aqui, é possível verificar semelhanças com o Partido dos Trabalhadores, em especial na fase da sua formação e nos primeiros anos. Em ambos confluíram várias vertentes do pensamento social. Também o PT assumiu-se como alternativa ao marxismo oficial do PCB e ao trabalhismo e, especialmente a partir do seu VI Encontro Nacional, no clima da queda do muro de Berlim, assumiu a democracia como centro da sua política, propugnando um resgate do socialismo democrático. Como o PSB do período estudado na obra, o PT terminou por enfatizar a estratégia eleitoralista, reservando para o socialismo o lugar das calendas.
A radicalização do movimento social nos anos 1960 gerou condições propícias para o surgimento de uma esquerda desvinculada tanto da tradição stalinista quanto da alternativa trotskista atuante à época, o Partido Operário Revolucionário (POR). Nesta conjuntura, acrescenta-se mais um ingrediente: o crescimento da esquerda católica, em especial no movimento estudantil. É neste contexto que surgem as duas organizações políticas analisadas, respectivamente, por Marcelo Badaró Mattos e Marcelo Ridenti: a POLOP e a AP.
Para a formação da POLOP convergiram militantes descontentes com o reformismo do PCB, setores radicalizados da Juventude Socialista do PSB (Guanabara), parte da Juventude Trabalhista (em Minas Gerais) e outros marxistas independentes. Em sua formação inicial participaram militantes destacados na política e na intelectualidade brasileira: Theotônio dos Santos, Moniz Bandeira, Ruy Mauro Marini, Juarez Guimarães, Emir e Eder Sader, Michel Lowy e Eric Sachs, mais conhecido pelo pseudônimo de Ernesto Martins. A POLOP também é reflexo de uma dissidência a nível internacional, que se distanciara tanto do stalinismo quanto do trotskismo. Neste sentido, seus militantes bebem em fontes luxemburguistas e no pensamento de autores poucos conhecidos no Brasil, como Brandler e Talheimer.
O autor do capítulo sobre a POLOP, intitula-o, apropriadamente, Em busca da revolução socialista: a trajetória da POLOP (1961-1967). Com efeito, a ORM-POLOP é a primeira organização marxista, depois dos trotskistas, que apresenta uma análise da revolução brasileira contestatória à concepção etapista hegemonizada pelo stalinismo e propõe um Programa Socialista para o Brasil. O autor analisa esta contribuição para o debate no seio das esquerdas, suas origens, composição, inserção nos movimentos sociais e faz um breve balanço.
O caso da Ação Popular é singular. Trata-se da síntese construída nos anos 60 entre o marxismo e o cristianismo. O estudo das origens da AP, suas propostas e sua trajetória peculiar nos ajuda a compreender subjetividades, potencialidades e contradições de projetos societários construídos historicamente. As relações entre religião e política, ou mais precisamente, entre religião e marxismo, permanecem como um mistério a ser desvendado: até que ponto a política é sacralizada? Até onde podemos falar em secularização da religião num sentido político?
O estudo desta experiência nos ajuda a entender esta difícil relação que, diga-se de passagem, não se restringe ao Brasil: esquerda católica e marxismo se mesclam em toda a América Latina. Retornando com força com força nos anos 1980, a partir da atuação das pastorais e Comunidades Eclesiais de Base fundadas na teologia da libertação, e também devido à experiência da revolução nicaragüense, é um fenômeno que mantém atualidade.
Neste capítulo, o autor também analisa as influências das revoluções cubana e chinesa e a tensão vivenciada pelos militantes da AP entre um humanismo cristão em vestes marxistas e a plena adesão ao ideário marxista, cujo significado pode ser medido por quem experimentou crises religiosa, pois, em última instância, trata-se da negação, não apenas da religião, mas da própria idéia de Deus. Crise semelhante vivenciaram os comunistas quando na década de 1950, tiverem que romper com o mito de Stalin, a partir das denúncias dos seus crimes. A questão é emblemática: nestes casos pode-se falar em superação plena da religião ou seria o caso de pensarmos num sacerdócio racionalista e secular, fundado em símbolos e na militância marxista. Com isto, sugerimos temas indicados pela leitura; o objetivo do autor, é claro, é analisar a experiência política da AP, das suas origens à sua completa dissolução nos anos 1980.
Sabemos que boa parte dos militantes da AP terminaram por abraçar a idéia de que o partido do proletariado é único e, nos debates do período, pareceu-lhes que este partido era o Partido Comunista do Brasil (observemos que vários dirigentes deste partido são originários da AP). Os organizadores da História do Marxismo anunciam que o próximo volume da História do Marxismo tratará, entre outros temas, do Partido Comunista do Brasil. Está ótimo! Porem, em nossa singela opinião, o presente volume, pelo período abordado, seria o espaço mais apropriado, pois, forneceria um quadro mais abrangente das esquerdas até os anos 1960.
Sabemos que a História do Marxismo é uma longa história. Quando, nos anos 1980, o prestigiado historiador Eric J. HOBSBAWM organizou a História do Marxismo, em âmbito internacional, abriu-se a possibilidade de compreensão desta história sem os maniqueísmos, sectarismo e dogmatismos presentes na trajetória dos marxistas. Como escreveu HOBSBAWM, prefaciando o primeiro volume da série:
“Comecemos pelo pressuposto evidente de que a História do Marxismo não pode ser considerada como algo acabado, já que o marxismo é uma estrutura de pensamento ainda vital e sua continuidade foi substancialmente ininterrupta desde o tempo de Marx e Engels”. (1983: 13)
Um projeto com esta amplitude só teria sucesso se partisse do princípio de que o marxismo deve ser tratado no plural, como também os temas e os autores devem respeitar este pluralismo. Neste sentido, o correto é mais correto nos referirmos aos marxismos e não propriamente ao marxismo, no singular. Como bem salientou Carlos Nelson Coutinho:
“Ao admitir o fato real do pluralismo nas investigações marxistas, não se está admitindo um relativismo vulgar ou um ecletismo anticientífico. O que está é se constatando outro fato real: que também no interior do marxismo, a busca da verdade não pode fugir à explicitação ampla e democrática de um debate aberto, de um livre confronto de idéias.” (Id., da apresentação)
Tudo isto parece óbvio, não fosse a tradição sectária, dogmática e autoritária presente no movimento comunista. Não por acaso, o próprio Marx recusou a alcunha de marxista. [1] Não esqueçamos que nos tempos sombrios as divergências eram superadas de uma forma abominável: pelo aniquilamento físico (Trotsky e os militantes dos POUM, durante a guerra civil espanhola, são exemplos clássicos desta triste memória histórica). Tempos em que se proibia a amizade, namoro ou qualquer tipo de aproximação com os inimigos da classe operária, ou seja, os trotskistas. Prevalecia a lógica da política amigo-inimigo.
Portanto, um dos aspectos mais relevantes desta História do Marxismo no Brasil, desde o seu primeiro volume, é o tratamento pluralista dos temas, seguindo a trilha aberta pela obra organizada por Hobsbawm. [2] O leitor mais jovem ou menos afeito à política marxista, no passado e no presente, pode até mesmo considerar natural tamanho pluralismo. Mero engano! Em outros tempos não muito longínquos, uma obra com estas características seria impensável e impraticável. Recordo-me por exemplo, das dificuldades que tive quando, nos anos 1980, encetei a saborosa aventura de escrever a História das Tendências no Brasil. À época, ainda sob o rescaldo da ditadura militar, este era um tema tabu: muitos se recusaram a falar sobre ele; outros nutriam uma desconfiança política-ideológica (afinal, era um jovem sem militância nas organizações tradicionalmente vinculadas ao marxismo); desconfiança no tocante à segurança (ainda se tentava superar os insuperáveis sofrimentos da ação repressiva e da clandestinidade). A todas estas dificuldades, perfeitamente compreensíveis, juntava-se a exígua disponibilidade de fontes bibliográficas.
Em compensação, o raiar da liberdade aguçou o espírito da nova geração sedenta de saber [3] ; uma geração sem militância nas organizações tradicionalmente vinculadas ao marxismo e que estavam sujeitas a um anticomunismo velado ou explícito, seja no interior de organizações como o PT, em movimentos pastorais ligados à Teologia da Libertação, no movimento sindical e social em geral. Nunca esqueço os conselhos para que me afastasse de determinado indivíduo, porque este cometia o grave pecado de ser comunista.
Minha geração, em sua maioria, desconhecia a História do Marxismo. E os marxistas não contribuíam muito para se fazerem conhecer. Reduzidos às organizações sobreviventes do ciclo ditatorial apegavam-se em demasia a uma retórica que dificultava a aproximação dos que ainda não haviam se iniciado nos mistérios da militância em tendências. Tratava-se de marcar posição, ocupar as trincheiras e fazer valer suas verdades. Este clima favorecia o sectarismo, mas não anulava os movimentos de tentativa de converter as consciências e conquistar novos quadros. Eram verdadeiros assédios às consciências em formação.
Converter-se pressupunha conhecer – sob o risco de se tornar um papagaio, repetidor de fórmulas e discursos políticos memorizados pelas leituras fáceis e a doutrinação dos líderes. E mesmo os não convertidos, pouco a pouco, se deram conta de que era preciso conhecer os marxistas, ainda que com o objetivo de melhor combatê-los. Num e noutro caso, o ato de conhecer estava vinculado ao agir, à militância.
Embora a época atual testemunhe, para muitos, a crise das utopias e o interesse acadêmico prevaleça sobre a curiosidade militante, pensamento que se faz ação, a obra História do Marxismo no Brasil é uma contribuição fundamental a quem deseje conhecer a trajetória dos partidos e organizações de inspiração marxista. Hoje, quando o Partido dos Trabalhadores governa cidades e Estados e se credencia para dirigir o país, torna-se fundamental retomar e aprender com a história. A História do Marxismo também cumpre este papel. Seja por objetivos acadêmicos, seja por desígnios militantes, é essencial conhecermos o nosso passado histórico.


[1] HAUPT analisa as origens dos termos marxismo e marxista e mostra sua evolução, da singularidade à pluralidade. (Ver: HAUPT, Georges. Marx e o marxismo. In: HOBSBAWM, Eric J. (org.) História do marxismo. Rio de Janeiro, Paz e Terra,  1980. Vol. 1, pp. 347-75). Também BATALHA, no volume 2 de História do Marxismo no Brasil, resgata este tema. (Ver: BATALHA, Cláudio H. M. A difusão do marxismo e os socialistas libertários na virada do século XIX. In: MORAES, João Quartim de (Org.) História do Marxismo no Brasil – Volume II: Os influxos teóricos. Campinas-SP, 1995, Editora da Unicamp, 1995, pp. 11-15).
[2] A idéia de elaborar uma História do Marxismo no Brasil surgiu a partir das discussões do Grupo de Trabalho Partidos e Movimentos de Esquerda, vinculado à Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (ANPOCS), criado em 1982 pelos professores Marco Aurélio Garcia, Paulo Sérgio Pinheiro e Leôncio Martins Rodrigues. O primeiro volume de História do Marxismo no Brasil foi lançado em 1991 (Rio de Janeiro, Paz e Terra). Esta obra, dividida em seis capítulos, trata do impacto das revoluções sobre o movimento operário brasileiro, com artigos de: Evaristo de Moraes Filho, João Quartim de Moraes, Michel Zaidan, Daniel Aarão Reis Filho, Raimundo Santos e Emir Sader. A partir do Volume II, a obra passou a ser publicada pela Editora da Unicamp. Os organizadores da obra planejam o lançamento do volume VI, que tratará da trajetória do PCB após o golpe militar de 1964, a (re) organização do Partido Comunista do Brasil (PC do B), as experiências da esquerda armada, os trotskistas nos anos pós-1966 e os marxistas no partido dos trabalhadores. Enquanto aguardamos ansiosamente a publicação da obra, sugiro ao leitor a seguinte bibliografia:
FREDERICO, Celso. A Esquerda e o Movimento Operário (três volumes: o primeiro, de 1987, editado por Edições Novos Rumos, São Paulo; os outros dois foram publicados pela Oficina de Livros, de Belo Horizonte, 1990 e 1991, respectivamente)
GORENDER, Jacob. Combate nas Trevas – A esquerda brasileira: das ilusões perdidas à luta armada. São Paulo, Ática, 1987
KECK, Margareth E. PT: A lógica da diferença – O Partido dos Trabalhadores na construção da democracia brasileira. São Paulo, Ática, 1991.
PORTELA, Fernando. Guerra de Guerrilhas no Brasil. São Paulo, Global, 1986.
REIS Fº, Daniel Aarão Reis. A Revolução faltou ao encontro – Os comunistas no Brasil. São Paulo, Brasiliense, 1990.
REIS Fº, Daniel Aarão e SÁ, Jair Ferreira de. (Orgs.) Imagens da Revolução: Documentos políticos das organizações clandestinas de esquerda dos anos 1961-1971. Rio de Janeiro, Editora Marco Zero, 1985.
SILVA, Antonio Ozaí da. História das Tendências no Brasil (Origens, cisões e propostas). São Paulo, Proposta Editorial, s.d.
__________. Os partidos, tendências e organizações marxistas no Brasil (1987-1994): permanências e descontinuidades. (Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciência Sociais da PUC/SP, sob orientação de Maurício Tragtenberg, em março de 1998)
[3] Um exemplo que ilustra esta sede de conhecimento sobre o marxismo foi a aceitação que teve o História das Tendências no Brasil, publicado em 1986/87. A primeira edição, em formato Jornal-Livro, teve a tiragem de cinco mil exemplares; a segunda edição, formato livro, foram dez mil. Sem contar com propaganda ou grandes esquemas de distribuição, as edições esgotaram-se. Deve-se registrar o trabalho de vários amigos e companheiros (que levavam os livros em suas bagagens para os eventos que ocorriam à época), o trabalho do Centro Pastoral Vergueiro (CPV), na verdade, o maior centro distribuidor para o movimento operário e popular; e, a contribuição da Editora Ensaio, que distribuiu o livro no chamado circuito comercial. Este registro não é uma necessidade do ego, mas apenas para ilustrar o clima da época no tocante ao tema.

Bertolt Brecht



Bertolt Brecht, 1931
Nome completo Eugen Berthold Friedrich Brecht
Nascimento 10 de Fevereiro de 1898
Augsburg, Baviera
Flag of the German Empire.svg Império Alemão
Morte 14 de agosto de 1956 (58 anos)
Berlim Leste, Estado de Berlim
Flag of East Germany.svg República Democrática da Alemanha
Ocupação Poeta, dramaturgo, contista
Escola/tradição Modernismo
Assinatura Brecht Unterschrift.jpg
Eugen Berthold Friedrich Brecht (Augsburg, 10 de Fevereiro de 1898Berlim, 14 de Agosto de 1956) foi um destacado dramaturgo, poeta e encenador alemão do século XX. Seus trabalhos artísticos e teóricos influenciaram profundamente o teatro contemporâneo, tornando-o mundialmente conhecido a partir das apresentações de sua companhia o Berliner Ensemble realizadas em Paris durante os anos 1954 e 1955.
Ao final dos anos 1920 Brecht torna-se marxista, vivendo o intenso período das mobilizações da República de Weimar, desenvolvendo o seu teatro épico. Sua praxis é uma síntese dos experimentos teatrais de Erwin Piscator e Vsevolod Emilevitch Meyerhold, do conceito de estranhamento do formalista russo Viktor Chklovski, do teatro chinês e do teatro experimental da Rússia soviética, entre os anos 1917-1926. Seu trabalho como artista concentrou-se na crítica artística ao desenvolvimento das relações humanas no sistema capitalista.
Recebeu o Prêmio Lênin da Paz em 1954.

Biografia

Brecht nasceu no Estado Livre da Baviera, no extremo sul da Alemanha, estudou medicina e trabalhou como enfermeiro num hospital em Munique durante a Primeira Guerra Mundial. Era filho de Berthold Brecht, diretor de uma fábrica de papel, católico, exigente e autoritário, e de Sophie Brezing (em solteira), protestante, que fez seu filho ser batizado nesta igreja.
Suas primeiras peças, Baal (1918/1926) e Tambores na Noite (Trommeln in der Nacht) (1918-1920), foram encenadas na vizinha Munique. Em sua participação no teatro Brecht conhece o diretor de teatro e cinema Erich Engel, com quem veio a trabalhar até o fim da sua vida.
Depois da primeira grande guerra mudou-se para Berlim, onde o influente crítico, Herbert Ihering, chamou-lhe a atenção para a apetência do público pelo teatro moderno. Trabalha inicialmente com Erwin Piscator, famoso por suas cenas Piscator, como eram chamadas, cheias de projeções de filmes, cartazes, etc. Em Berlim, a peça Im Dickicht der Städte, protagonizada por Fritz Kortner e dirigida por Engel, tornou-se o seu primeiro sucesso.
O Nazismo afirmava-se como a força renovadora que iria reerguer o país, pretendendo reviver o Sacro Império Romano-Germânico. Mas, ao mesmo tempo, chegavam à Alemanha influências da recém formada União Soviética.
Com a eleição de Hitler, em 1933, Brecht exila-se primeiro na Áustria, depois Suíça, Dinamarca, Finlândia, Suécia, Inglaterra, Rússia e finalmente nos Estados Unidos.
Seus textos e montagens o fizeram conhecido mundialmente. Brecht é um dos escritores fundamentais deste século: revolucionou a teoria e a prática da dramaturgia e da encenação, mudou completamente a função e o sentido social do teatro, usando-o como arma de consciencialização e politização.
Teve três filhos com Helene Weigel: Stefan Brecht, Barbara Brecht-Schall e Hanne Hiob.

Obra

As suas principais influências foram Constantin Stanislavski, Vsevolod Emilevitch Meyerhold, Erwin Piscator e Viktor Chklovski.
Algumas de suas principais obras são: Um Homem é um Homem, em que cresce a ideia do homem como um ser transformável, Mãe Coragem e Seus Filhos, sobre a Guerra dos Trinta Anos, escrita no exílio, no começo da Segunda Guerra Mundial, e A Vida de Galileu. Afirma Bernard Dort a respeito deste último:
Cquote1.svg Galileu foi escrita, pelo menos originalmente, para servir de exemplo e de conselho aos sábios alemães tentados a abdicar seu saber nas mãos dos chefes nazistas. Cquote2.svg
Além dessas, escreveu também Seu Puntila e seu Criado Matti, A Resistível Ascensão de Arturo Ui, O Círculo de Giz Caucasiano, A Boa Alma de Setzuan, A Santa Joana dos matadouros e A Ópera dos Três Vinténs.
"Bertolt Brecht". Escultura de bronze, por Fritz Cremer. Praça Bertolt Brecht, em Berlim, em frente ao Berliner Ensemble

Teatro Épico

Não é simples falar sobre o conceito que Brecht tinha do teatro, apesar de ao longo de 30 anos haver escrito ensaios e comentários sobre este tema. Este autor era mais um pensador prático, que sempre recriava suas peças ou "experimentos sociológicos", como as preferia chamar, no intuito de aperfeiçoá-las. Pois era através delas que toda sua teoria, crítica e pensamento seriam expostos.
Além de dramaturgo e diretor, Brecht foi responsável por aprofundar o método de interpretação do teatro épico, uma das grandes teorias de interpretação do século XX. Uma das grandes influências no desenvolvimento desta forma de interpretação foi a arte do ator Mei Lan-Fang, que Brecht acompanhou numa representação em Moscou em 1935.
Descreve Brecht em Escritos sobre Teatro um relato deste ator chinês que informa muito sobre a forma de interpretação no teatro épico, ao representar papéis femininos. Mei Lan-Fang repetira várias vezes numa palestra, por seu tradutor, que ele representava personagens femininos em cena, mas que não era imitador de mulheres. Continua Brecht, descrevendo uma demonstração das técnicas deste ator num encontro, que este ator, de terno, executava certos movimentos femininos, ressaltando sempre a presença de duas personagens, um que apresentava e outro que era apresentado. Brecht sublinha que o ator chinês não pretendia andar e chorar como uma mulher, mas como uma determinada mulher (pg40, vol2).

Interpretação épica

Segundo Rosenfeld, "Foi desde 1926 que Brecht começou a falar de ‘teatro épico’, depois de pôr de lado o termo ‘drama épico’, visto que o cunho narrativo da sua obra somente se completa no palco" (ROSENLD, 1965, p. 146), é possível inferir, portanto, a importância que a encenação tem para os textos brechtianos. É só através da atitude dos atores, do cenário, da música, dos sons e até do silêncio que seu pensamento se completa, só através destes elementos que seu texto causará o efeito desejado, caso o contrário não causará o impacto devido.
No início de sua carreira Brecht estabelece os elementos de uma nova forma de interpretação para o ator. Em, a propósito dos critérios de apreciação da arte dramática, defende o ator Peter Lorre de críticas negativas dizendo que uma interpretação gestual levará o público a exercer uma operação crítica do comportamento humano. Afirma que cada palavra deve encontrar um significado visual e através do gesto o espectador pode compreender as alternativas da cena (Peixoto, 1974, 2. edição, pg; 68).
Peixoto descreve que para Brecht a interpretação gestual deve muito ao cinema mudo, principalmente a Chaplin, que elaborara uma nova forma de figuração do pensamento humano (Peixoto, 1974, 2. edição, pg; 68). Esta preocupação levará a que Brecht defina o conceito de gestus na interpretação e montagem de suas peças.

Influências

Conforme destaca Fredric Jameson, em seu Método Brecht, algumas das inovações propostas pela cena brechtiana são similares àquelas propostas por importantes artistas modernistas no teatro ou em outras artes. Destacam-se entre eles a dramaturgia de Frank Wedekind, influência reconhecida pelo próprio Brecht, o romance Ulysses de James Joyce, as propostas cubo-futuristas de Maiakovski, ou construtivistas no cinema de Sergei Eisenstein e, principalmente, os postulados do diretor de teatro Meyerhold e os procedimentos de colagem nos trabalhos de Picasso.
Willet, por outro lado, reforça o aspecto da construção narrativa em seu trabalho: Com Brecht os mesmos princípios de montagem espalham-se ao teatro pois a forma narrativa do teatro épico seria mais adequada para se lidar com temas sócio-econômicos, evidenciando Willet que a montagem foi a técnica estrutural mais natural na prática artística brechtiana (1978, 110).



György Lukács
Nascimento 13 de abril de 1885
Budapeste
Morte 5 de junho de 1971 (86 anos)
Budapeste
Nacionalidade  Hungria Húngaro
Influências
Escola/tradição Marxismo
György Lukács ou Georg Lukács (AFI[ɟørɟ lukɑːtʃ], Budapeste, 13 de abril de 1885 — Budapeste, 5 de junho de 1971) foi um filósofo húngaro de grande importância no cenário intelectual do século XX. Segundo Lucien Goldmann, Lukács refez, em sua acidentada trajetória, o percurso da filosofia clássica alemã: inicialmente um crítico influenciado por Kant, depois o encontro com Hegel e finalmente, a adesão ao marxismo. Seu nome completo era Georg Bernhard Lukács von Szegedin em alemão ou Szegedi Lukács György Bernát em húngaro.

Obra

História e Consciência de Classe
Escrito entre 1919 e 1922 e publicado em 1923, "História e Consciência" inicia a corrente de pensamento que passou a ser conhecida como marxismo ocidental. O livro é notável pela contribuição ao debate concernente à relação entre sociologia, política e filosofia com o marxismo e pela reconstituição da teoria marxista da alienação, antes dos escritos de juventude do jovem Marx terem sido publicados. O trabalho de Lukács elabora e expande-se sobre teorias marxistas tais como ideologia, falsa consciência, reificação e consciência de classe.
Para Lukács, "ideologia" é realmente a projeção da consciência de classe da burguesia, que funciona para prevenir que o proletariado atente para a real consciência de sua posição revolucionária. A ideologia determina mais a "forma de objetividade" do que a estrutura do conhecimento por si mesmo. A ciência do real deve se ater, de acordo com Lukács, ao pensamento da "totalidade concreta" através de que é possível pensar objetivamente um período histórico. Destarte, as chamadas "leis" eternas da economia são desmistificadas como ilusão ideológica projetada pelo objetivismo ("O que é Marxismo Ortodoxo?", parágrafo 3º). Ele também escreve: "Somente quando o coração do ser mostra-se como ser social, pode aparecer como um produto, inconsciente, da atividade humana, e esta atividade, por sua vez, é o elemento decisivo de transformação do ser." ("O que é Marxismo Ortodoxo?", parágrafo 5º). Finalmente, o "marxismo ortodoxo" não é definido como uma interpretação de O Capital como se este fosse uma Bíblia, mas como fiel ao método marxiano, à sua dialética.
Lukács apresenta a categoria da reificação argumentando que, devido à natureza íntima da sociedade capitalista, as relações sociais transformam-se em 'coisificação', impedindo o surgimento da consciência de classe. É neste contexto que um partido leninista emerge, no sentido de um revigorado marxismo dialético.
Já no ensaio homônimo à obra, “História da Consciência de Classe” (1920), Lukács lida primeiramente com a ausência da conceituação de classe em Marx, definindo-a como posição no modo de produção. A cada classe no capitalismo há uma consciência equivalente. Essa consciência não consiste no entendimento pessoal ou psicológico dos interesses individuais dos membros da classe, tampouco a soma ou a média desses entendimentos, mas seu sentido histórico: a história permite que uma consciência seja interpretada racionalmente e adjudicada à classe.
Lukács concentra-se, então, na análise de duas classes: burguesia e proletariado. A burguesia, apesar de poder teoricamente entender a totalidade da sociedade, tem sua compreensão obstada pelos seus interesses e sua consciência assim fadada a uma falsa consciência. O proletariado tem o potencial pleno para a consciência da totalidade porque tem interesse na destruição do modo de produção capitalista; falta-lhe, porém, desvencilhar-se da falsa consciência tomada emprestada da burguesia, que estruturalmente e ideologicamente submete o todo da sociedade aos seus interesses. Para o filósofo húngaro, a revolução proletária não viria passivamente, mas como resultado da tomada de consciência pelo proletariado. As crises do capitalismo forçariam o proletário a abrir os olhos, conscientizar-se de sua posição de classe e identificar seus interesses com aqueles indicados historicamente.
No fim da carreira, Lukács repudiou as idéias de "História e Consciência de Classe", em particular a crença no proletariado como sujeito-objeto da história (1960: posfácio da tradução francesa), mas escreveu uma defesa deles, assim como fizera em 1925 e 1926. Este livro Lukács chamou "A Defesa de História e Consciência de Classe" e somente foi publicado em húngaro, em 1996, e inglês, em 2000. Esta obra talvez tenha sido o mais importante texto marxista desconhecido do século XX.

Crítica literária e estética

Além de ser um pensador do marxismo político, Lukács foi também um dos mais influentes críticos literários no século XX. Sua importante obra de crítica literária começou bem cedo em sua carreira, com A Teoria do Romance, um trabalho seminal de teoria literária. O livro é uma história do romance enquanto forma literária, e uma investigação de suas distintas características, e demonstra forte inspiração hegeliana.
Lukács posteriormente, quando mais afeito às idéias do marxismo clássico, repudiaria A Teoria do Romance, escrevendo uma introdução que o descreve como errôneo, apesar de conter um anti-capitalismo romântico que seria mais bem desenvolvido depois dentro do marxismo. (Esta introdução também contém sua famosa rejeição de Theodor Adorno e outros expoentes do marxismo ocidental, como tendo tomado assento no "Grand Hotel Abyss".)
O trabalho de crítica literária de Lukács inclui o bem conhecido ensaio "Kafka ou Thomas Mann?", no qual Lukács argumenta em favor da obra de Thomas Mann como uma superior adequação às condições da modernidade, enquanto critica o modo de inserção de Franz Kafka no modernismo. Lukács opôs-se às inovações formais de escritores modernistas como Kafka, James Joyce, e Samuel Beckett, preferindo a estética tradicional do realismo. Ele defendia o caráter revolucionário dos romances de Sir Walter Scott e Honoré de Balzac. Lukács afirmava que ambos os autores, a despeito de suas nostalgias dos tempos aristocráticos, escreviam com um acurado senso crítico por causa de suas oposições à ascensão da burguesia (diferindo-se da oposição reacionária). Este ponto de vista foi expresso no seu último livro O Romance Histórico.
Além desse trabalho, são notáveis os textos "Notas sobre o romance" e "Narrar ou descrever?", em que o autor se debruça mais meticulosamente sobre a concepção marxista da literatura. No primeiro desses textos, Lukács faz uma revisão histórica da formação do gênero romanesco, desde as suas origens, passando pela época de sua consolidação histórica e chegando a prognósticos (considerados precipitados por vertentes teóricas de cunho marxista, mas substancialmente divergentes da de Lukács) a respeito das suas feições quando do triunfo do proletariado.
Ao mesmo tempo, o romance começa a adquirir forma, tendo como principal exemplo o livro de Miguel de Cervantes, Dom Quixote. Segundo Lukács, com o capitalismo, há a passagem de uma consciência coletiva para uma consciência individualista que leva, mais tarde, à formação do romance enquanto forma predominante da sociedade burguesa. Nesse sentido, o romance caminha para a solução realista, depois de ter passado pelo romance histórico de Walter Scott; surge, portanto, o romance realista como forma literária que apreende a individualidade como parte de uma estrutura mais geral. Dito de outro modo, de acordo com Lukács, orientado pelas principais teses do materialismo dialético, o romance realista é a forma literária por excelência da burguesia na medida em que privilegia o tipo - isto é, uma situação típica vivenciada por um personagem típico -, colocado sobre um pano de fundo histórico relevante; assim, de acordo com essa perspectiva, tem-se uma compreensão geral das contradições que engendram a sociedade burguesa e capitalista, uma vez que a situação narrada permite vislumbrar não só a particularidade que define a literatura, mas também o quadro geral de construção da mentalidade e de desvendamento das contradições e ideologias da sociedade capitalista. Nesse sentido, as ações, muito mais do que as minúcias descritivas, interessam mais ao crítico. Lukács destaca, então, a obra de Honoré de Balzac como paradigmática dessa relação.
Adiante, nesse mesmo ensaio, Lukács manifesta o seu repúdio pelas formas literárias naturalistas, que, segundo ele, em favor de "formalismos", sacrificam o nível actancial da narrativa, a fim de relevar aspectos da realidade que não necessariamente contribuem para um esclarecimento do público acerca de sua condição social. Dessa forma, escritores como Gustave Flaubert - e, mais tarde, todo o empreendimento das vanguardas históricas - são muito mal vistos pelo pensador húngaro.
O outro ensaio, "Narrar ou descrever?" retoma os aspectos abordados no ensaio acima. De forma programática, Lukács afirma que, em nome da construção de uma consciência mais crítica acerca do papel social dos sujeitos - que, segundo ele, é um dos objetivos da arte -, o "narrar" é preferível ao "descrever", na medida em que o primeiro revela contradições a partir de situações típicas, e o segundo descamba para formalismos que alienam o público.
Além desses ensaios, Lukács escreveu longos volumes sobre Estética. É notável, nessa sua produção, a reiteração de idéias sobre a deontologia da arte e da literatura. De acordo com o seu ponto de vista, que reflete apenas um dos desdobramentos possíveis e consolidados da epistemologia marxista - ao qual se opõe, por exemplo, o ponto de vista de Theodor Adorno, o papel principal da arte é contribuir para a transformação da consciência do indivíduo, apresentando-lhe formas alternativas e profundamente críticas de confronto com a sociedade capitalista e seu modo de produção. Como vimos acima, Lukács acredita que apenas o realismo artístico pode produzir esse grau de comprometimento e consciência. Todavia, cumpre lembrar que essa visão estreita contribuiu, mais tarde, para a erupção do Realismo Socialista russo, que condenou, entre outros, artistas de vanguarda engajados na produção artística comprometida com os ideais marxistas, apesar de partirem para a crítica da sociedade burguesa segundo outro viés.
Marxismo Ocidental um conjunto de análises marxistas produzidas por autores, primeira e especialmente europeus (mas não somente), críticos do marxismo produzido na antiga União Soviética e nos países, então socialistas, do leste europeu. A expressão aparece pela primeira vez no livro de Maurice Merleau-Ponty, Les Aventures de la Dialectique (As Aventuras da Dialética), publicado em 1955 [1]. Segundo Merleau-Ponty, essa variante do marxismo começa com a publicação do livro Geschichte und Klassbewusstsein (História e Consciência de Classe), escrito por Georg Lukács[2], e Marxismus und Philosophie (Marxismo e Filosofia), escrito por Karl Korsch[3], ambos publicados em 1923.

A partir dos anos 1920 alguns intelectuais marxistas introduziram novas maneira de pensar e refletir acerca do conceito central da filosofia marxista - a luta de classes -, que, para Marx, é o motor das mudanças sociais e econômicas através da história.
A análise marxista ortodoxa tinha como eixo o conceito de modo de produção, que se constitui, atinge seu ápice e, posteriormente, sua decadência, para ser substituído por outro que atenda às novas necessidades sociais e econômicas. Já os marxistas do ocidente consideravam outros elementos, tais como a cultura e a filosofia política, para identificar essas mudanças que as sociedades sofrem com o passar do tempo, e comprovar que não somente se davam através da substituição de um modo de produção obsoleto. Acreditavam que atrelar essas mudanças tão somente ao fator econômico, sem a análise de fatores externos diversos, aproximava demais essa teoria do positivismo. Armados de suas novas teorias, esses pensadores observavam a evolução do comportamento social com base no homem, um ser mutante social, dotado de razão que transforma seu meio por inúmeras influências e necessidades. O princípio está no entendimento dos diversos níveis da sociedade e no homem como ser transformador. A Escola de Frankfurt fez parte desse movimento europeu de renovação do pensamento marxista, que foi chamado, Marxismo Ocidental. As novas teorias destes intelectuais não agradaram os partidos comunistas, que reagiram de maneira severa.
Nos anos 1960 nasce em Londres a revista política New Left Review, formada basicamente por historiadores e cientistas sociais. A revista dedicou-se à divulgação dessas novas idéias de diferentes escolas marxistas e circula até hoje, difundindo novas reflexões acerca de mudanças sociais de um modo geral. Seus principais representantes são: Christopher Hill, Eric Hobsbawm, Perry Anderson e E. P. Thompson. A NLR atravessou o Atlântico e influenciou historiadores e intelectuais que fizeram uma nova análise da historiografia americana. A nova esquerda conciliou a teoria do Marxismo Ocidental e a teoria crítica com a renovação historiográfica dos anos 1960, dando origem a uma nova reflexão sobre tempo, memória e história e criando uma nova visão dos fatos históricos.

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Caderno BVD


Explanação

Edição 2149 - Publicado em 29/Setembro/2012 - Página D3

1. O desejo de combater a doença


“Demônios!”, brada Nitiren Daishonin. Essa é uma firme repreensão com raiva, às funções da maldade que estavam empenhadas em tirar a vida de seu jovem discípulo.
Imagine o desespero e a indignação de um pai que presencia a doença de um filho. O desejo de erradicar a doença do filho com todas as suas forças é o sentimento que Daishonin demonstra nesta carta.
Como devoto do Sutra de Lótus, ele orienta rigorosa e amavelmente seu jovem discípulo que continuará a missão de propagar a Lei Mística.
Ele insiste que Nanjo Tokimitsu lute e triunfe sobre a maldade para comprovar o aspecto de “iluminação”.

2. Por que Nitiren adverte desta forma?


Trata-se de uma refutação de Daishonin como devoto do Sutra de Lótus, na qual ele pretende denunciar o errôneo e esclarecer a verdade. Em outras palavras, é o Chakubuku. Ele diz que provocar sofrimento a Nanjo Tokimitsu, um discípulo do devoto do Sutra de Lótus, é se tornar inimigo de todos os budas das dez direções e das três existências.
Ele adverte os demônios, ordenando-os a combater a própria condição de vida de sofrimentos e manifestar proteção a este praticante do Sutra de Lótus. Caso contrário, diz ele, “terão a cabeça partida em sete pedaços e, após falecerem, cairão no grande inferno de incessantes sofrimentos” (cf. END, v. I, p. 426).
Sem dúvida, ele quis mostrar a Nanjo Tokimitsu sua destemida convicção como devoto do Sutra de Lótus.

3. O que essa advertência ensina?


Por existirem essas funções da maldade, devemos fortalecer cada vez mais as orações do devoto do Sutra de Lótus, que é uma oração focada no Kossen-rufu.
Isso é repreender a maldade da doença e estabelecer um avanço com a determinação de transformar todas as funções da maldade em aliados da missão do nosso curso de vida.
É importante recitarmos o Daimoku de rugido do leão.
Daishonin escreve: “O Nam-myoho-rengue-kyo é como o rugido de um leão. Que doença pode, portanto, ser um obstáculo? Está escrito no sutra que os que abraçam o Daimoku do Sutra de Lótus serão protegidos pela Kishimojin3 e suas dez filhas”4 (END, v. I, p. 275).

4. O presidente Toda esclarece
POR QUE SOFREMOS


O segundo presidente da Soka Gakkai, Jossei Toda, incentivou: “Exteriormente, às vezes, podemos nos parecer com um ‘Bodhisattva Pobreza’ ou um ‘Bodhisattva Doen­ça’, mas é apenas um papel que estamos encenando no drama da vida. Na realidade, o verdadeiro lugar dessa vida é no interior de nosso aspecto autêntico como Bodhisattvas da Terra! Como a vida é um grande drama, devemos desfrutar completamente do papel que assumimos e comprovarmos a grandiosidade da Lei Mística”.

5. Qual é a prova do Sutra de Lótus?


O presidente Ikeda explica que o importante é vencer e comprovar os benefícios do budismo na vida.
“O que é a verdadeira saúde? Não é simplesmente a ausência de doença. Saúde é confrontar a doença com alegria a ponto de inspirar as outras pessoas a terem esperança. Aqueles que transformam o carma da doença em missão e manifestam uma poderosa vitalidade já triunfaram sobre o demônio da doença. A verdadeira saúde do corpo e da mente é encontrada em meio à vigorosa luta, baseada numa corajosa prática da fé de um rei leão. Este é o ensinamento do Budismo Nitiren”.

6. Partindo para a ação


- Seja qual for a maldade da doença, a vitória absoluta é confrontá-la com uma prática da fé que desperta no coração a poderosa coragem de um rei leão.
- Utilize a doença como oportunidade para varrer da vida o mau carma e incentivar as demais pessoas a vencer.
- Sua postura diante dos obstáculos da vida é que faz toda a diferença, enfrente os demônios da maldade como o Buda Nitiren e vença infalivelmente.

7. Conclusão do mestre


“O ardente rugido do leão de Daishonin sensibilizou o jovem discípulo e o fez aprofundar sua resoluta convicção de jamais ser derrotado pelas funções negativas que o atacara. E, de fato, Nanjo Tokimitsu superou a doença e viveu por mais cinquenta anos.
Quando o discípulo se esforça com o mesmo espírito do mestre, não há qualquer obstáculo ou função demoníaca que não sejam superados, e não há doença que não seja positivamente transformada de acordo com o princípio da “transformação do veneno em remédio”. A partir de agora, com base neste escrito, vença as adversidades sendo um verdadeiro leão e demonstre para as outras pessoas o poder da prática da fé.