Diálogos com presidente Ikeda


Convivência  inter-religiosa

Peccei: Será que as diferentes religiões conseguiram enfrentar o desafio desta crise extraordinária que vivemos no mundo? Até que ponto os diferentes credos ajudam o homem moderno em seu dilema? Ou estarão todas as igrejas, fés e religiões fadadas a trabalhar sozinhas para sempre, cada qual proclamando seu próprio credo e cuidando de seus interesses? Qual é sua opinião? Que iniciativa a Soka Gakkai toma a respeito?


Ikeda: As perguntas que senhor faz são implacáveis e exigem meditação honesta e séria. Para ser bastante franco, considero os movimentos de tentativa de unificação religiosa realizados por diversas religiões quase uma fraude. Qualquer religião, para continuar a ser uma religião, precisa estar convencida de que suas próprias doutrinas são as corretas. Na prática, a junção de religiões exigiria uma transigência em questões de doutrina que considero inaceitável.
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    São os poluentes da vida humana – em termos budistas, os anteriormente mencionados Três Venenos: ambição, ira e insensatez – que incentivam o homem ao preconceito e ao ódio e alimentam a confusão e o conflito inescrupuloso. Em outras palavras, as causas de toda a infelicidade se encontram na própria vida humana. O cristianismo, o islamismo e o budismo ensinam que o amor e a compaixão, ultrapassando as diferenças de raça e ideologia, são os meios de promover a compreensão mútua e atingir um tipo de diálogo inter-religioso da espécie humana. No entanto, o amor e a compaixão por si só não foram capazes de erradicar a ambição, a ira e a insensatez, que são o âmago do problema. Além disso, movimentos pela unidade religiosa da humanidade baseados nessas ideias nunca foram muito longe ou, pior, tenderam a incentivar o ódio e o desprezo entre adeptos de diferentes fés. Um dogmatismo insignificante ou diferenças de cerimônias levavam, frequentemente, os membros de uma religião a dividir-se em facções mais inimigas uma da outra do que crenças totalmente diferentes e, às vezes, instigavam as pessoas a dar menos valor à vida de seus irmãos humanos do que à vida de animais não humanos.
    A culpa desse tipo de ódio não deve ser atribuída ao espírito do amor e da compaixão, mas sim à ambição, à ira e à estupidez que são inerentes à vida. A religião é a força que pode controlar essas características humanas indesejáveis. A inegável verdade de que elas nem sempre foram controladas parece mostrar a impotência das religiões. Porém isso não é necessariamente verdadeiro. O valor de uma religião depende de sua capacidade de conter a ambição, o ódio e a insensatez e, dessa forma, permitir o surgimento do espírito do amor e da compaixão. É por isso que abraço uma religião que ensina a revolução humana do seu interior. Em outras palavras, um ensinamento religioso não é capaz de reprimir o lado escuro da natureza humana, mas deve ser o meio pelo qual o indivíduo possa criar, dentro de si mesmo, a força que, aliada à sua força de vontade, possa superar os Três Venenos.
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