Violência só acabará quando Ocidente parar de financiar insurgência, diz embaixador sírio


Violência só acabará quando Ocidente parar de financiar insurgência, diz embaixador sírio

Para o diplomata Mohammed Khaddour, a mídia também "está incentivando a violência contra o povo sírio"

Thiago Herdy /Divulgação PCB
Na esteira da Primavera Árabe, onda de manifestações por países do Oriente Médio e do Norte da África, a Síria vive um conflito próprio, que se diferencia do egípcio ou tunisiano. Desde março de 2011, simpatizantes e opositores do governo do presidente Bashar Al Assad se enfrentam em sangrentas batalhas em diversas cidades sírias, sendo o epicentro Homs.

As poucas informações colhidas pela imprensa estrangeira, que tem dificuldades para reportar a partir da Síria, retratam uma luta desproporcional, com as forças de Assad sendo superiores às dos opositores. Por outro lado, informações de que a insurgência contra o regime sírio é sustentada pelo Ocidente, interessado na queda do presidente, começam a aparecer no noticiário internacional. No fogo cruzado ficam os civis, as maiores vítimas dos conflitos. Segundo informações do Crescente Vermelho, há 200 mil refugiados sírios em outros países. O número de mortos na região é estimado em cerca de 8.500, de acordo com organizações humanitárias.

Opera Mundi questionou em entrevista exclusiva o embaixador da Síria no Brasil, Mohammed Khaddour (foto acima), sobre esses e outros temas relacionados ao conflito sírio durante evento no Rio de Janeiro pelos 90 anos do PCB (Partido Comunista Brasileiro). Segundo o diplomata, o governo sírio está disposto a colaborar com as missões internacionais para ajudar os civis, mas diz que a violência no país apenas irá acabar “quando o Ocidente e os países da região pararem de financiar armas aos guerrilheiros”.

De acordo com Khaddour, não há oposição na Síria e cerca de 70% da população é favorável a Assad. A maioria das informações coletadas pela imprensa sobre a Síria não é verdadeira, avalia Khaddour. “A imprensa não deveria contribuir para apresentar uma imagem não real para não fazer estragos nas relações internacionais”. O embaixador nega que haja tortura, assim como rejeita a informação de que há refugiados sírios.

Opera Mundi – O Sr. acredita no fim da violência na Síria após a chegada das últimas missões, da ONU (Organização das Nações Unidas) e da Liga Árabe?
Mohammed Khaddour – A violência na Síria somente vai acabar quando o exterior e os países de região pararem de financiar armas aos guerrilheiros. O governo sírio colaborou com as missões da Liga Árabe e da ONU e está disposto sempre a colaborar, mas os países da região e do Ocidente também tem que colaborar para dar um fim à ingerência na Síria.

A violência está diminuindo. Ela tem origem na Al Qaeda, na Irmandade Muçulmana e em contrabandistas de armas. É isso o que está causando a violência na Síria.

OM – Como o Sr. vê a situação da Síria hoje?
MK – Hoje a situação da Síria é melhor que a de ontem. Diminuímos a criminalidade; o terrorismo coletivo está sendo executado por indivíduos e não mais por grupos grandes. Tudo graças ao apoio do povo. Foi um trabalho conjunto entre povo e governo para diminuir a quantidade de terroristas na Síria.

OM – A informação que chega é que grande parte da violência na Síria é gerada pelo confronto entre simpatizantes do governo e opositores. O presidente Assad está disposto a dialogar com essa oposição?
MK – Na Síria não há oposição. Essa oposição mostrou algum projeto ou tentou conversar com o governo para chegar a um acordo?

Efe (21/03/2012)

Apoiadores do presidente sírio, Bashar al-Assad, participam de manifestação pró-governo em Damasco

OM – Quem são os que se dizem opositores do governo?
MK – São instrumentos usados pelo Ocidente para alcançar objetivos do interesse do próprio Ocidente. Esses opositores estão no exterior, se recusaram a dialogar. O Ocidente e os países da região não incentivaram o diálogo. Pelo contrário, incentivaram a não dialogar. Se essa oposição realmente tem planos, projetos, e quer dialogar, o governo está de braços abertos para conversar. Mas sempre dentro do governo e longe da interferência externa.

Não queremos gente de fora dizendo o que devemos fazer. Se eles são uma oposição nacional, o governo os chamará para participar do diálogo nacional e contribuir para desenvolver a Síria. É o que queremos. Pelo menos 70% da população está com o presidente, que tem projeto de reformas no país. Se há 200 pessoas que são mostradas pelas TVs, se esquecem dos outros 20 milhões de sírios e suas necessidades. Eu respeito os meios de comunicação, mas infelizmente, o problema é que não há informações verdadeiras da Síria para a imprensa brasileira. A mídia ocidental sabe a realidade, mas não quer mostrá-la. Temos que olhar para a realidade.

Se há 100 pessoas que se dizem oposição fora da Síria, existem outros 24 milhões de sírios dentro do país que estão com o presidente Bashar. Podemos vê-los nas praças ao lado do presidente, mas a mídia não vê isso, só vê pessoas de outros países se dizendo oposição. Isto não é justo. A imprensa não deveria contribuir para apresentar uma imagem não real para não fazer estragos nas relações internacionais.
OM –  O secretário geral da ONU, Ban Ki-moon, disse no último dia 20 que a comunidade internacional deve agir rapidamente para por um fim à crise da Síria. O Sr. teme algum tipo de intervenção externa?
MK – Nós queremos acabar com a violência na Síria e o povo sírio também. Sempre procuramos entender essas intenções como positivas, especialmente quando todo mundo sabe que na Síria existe violência de guerrilha.

OM –  Quem é a guerrilha que o Sr. menciona?
MK – São grupos radicais religiosos, salafistas, a Irmandade Muçulmana, grupos de Al Qaeda e contrabandistas de armas que se beneficiam de todos os lados.

OM –  Por que presença do CICV (Comitê Internacional da Cruz Vermelha) não foi autorizada?
MK – Nós recebemos comissões internacionais. Sempre desejamos receber ajuda, qualquer ajuda é bem-vinda. Mas sempre sob a soberania da Síria. Esses grupos terroristas são os que impedem a chegada da ajuda humanitária ao governo em algumas áreas que eles ocuparam à força. Nós temos a Cruz Vermelha na Síria.

OM –  A ONG Anistia Internacional denuncia que o governo sírio torturou prisioneiros, até mesmo crianças, além de realizar prisões arbitrárias. Como o Sr. responde a essas denúncias?
MK – A maioria das informações coletadas sobre a Síria está incorreta porque essas missões não visitaram a Síria, não estiveram lá, tiveram apenas as informações dos que se dizem oposição e estão no exterior. A mídia está incentivando a violência contra o povo sírio. Eu afirmo categoricamente que o governo sírio jamais faria isso contra seu povo. Quem fez aquelas matanças são os próprios terroristas, que filmaram e apresentaram para a mídia internacional que os está incentivando.

OM –  A informação é que o número de refugiados na Síria chega a quase 200 mil pessoas, segundo dados divulgados pelo Crescente Vermelho.
MK – Onde estão esses refugiados? Não existe, não tem. A Síria tem fronteiras com outros países. Membros dessas guerrilhas entram e saem diariamente por essas fronteiras e alguns países aproveitaram essa entrada e saída para dizer que tem refugiados sírios. Países da região, antes desse acontecimento, começaram a preparar campos e tendas para refugiados, eles já estavam colaborando para mostrar ao mundo que há refugiados. Se realmente alguns cidadãos sírios fugiram é devido a guerrilheiros que ocuparam esses locais.

Efe (19/03/2012)

Refugiados sírios se abrigam em barracas montadas no acampamento de Reyhanli, em Antakya, na Turquia

OM –  Como o Sr. vê as eleições legislativas, marcadas para 7 de maio? É uma forma de dar resposta às pressões da comunidade internacional?
MK – São eleições legítimas, porque acabaram os quatro anos de mandato dos parlamentares e está para ser renovado o Parlamento. As eleições atrasaram devido à violência. Não é uma reação para o Ocidente, é uma coisa natural. Esse novo parlamento terá novos partidos e uma nova Constituição, que já foi votada e aprovada pelo povo sírio.

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