Diálogo


Budismo e islamismo [parte 4]

Edição 2143 - Publicado em 11/Agosto/2012 - Página A3

Diálogo entre o presidente da SGI, Dr. Daisaku Ikeda, e o Prof. Dr. Majid Tehranian, formado em Harvard e ex-professor da Universidade do Havaí

Tehranian: Você se torna mais consciente de sua fé. Algumas pessoas dizem até que adquirem o sentimento de que sua missão foi cumprida. No dia a dia, podemos facilmente ser vítimas da inércia, mas o ramadã transmite uma sensação valiosa de ritmo. Recordo-me de que, quando tinha 15 anos, idade em que os meninos muçulmanos são considerados adultos, quão ansioso estava para me juntar a outros familiares e fazer o jejum. Acordávamos antes do nascer do sol, fazíamos nossa refeição da manhã e realizávamos as orações no início do dia. Havia muito entusiasmo no ritual.
Ikeda: Outra cena muito conhecida ligada ao Islã é a forma como os praticantes oferecem orações onde quer que estejam. Seja na mesquita, num edifício comercial moderno ou até mesmo num campus universitário, os muçulmanos – jovem ou velho, homem ou mulher – são vistos orando ajoelhados num carpete ou tapete.
Tehranian: Eles oram em direção à Kaaba, em Meca. No cristianismo e no budismo, os santuários e as capelas são locais em que seus praticantes oram em frente ao objeto de adoração. No Islã, no entanto, mesmo quando você está na mesquita, direciona suas orações à Meca voltado para a parede do prédio. A razão dessa prática representa a total negação pelo Islã na existência de um objeto de adoração, que é a grande diferença de outras religiões. Em qualquer mesquita você encontrará uma parede oca em direção à Meca.
Ikeda: É comum assistirmos em documentários, nos quais se aborda o islamismo mundial, a cena de uma mesquita majestosa numa manhã ainda nublada e ouvir o som solene do adhan dos minaretes com o chamado: “Levante-se para a oração e para o sucesso!”, “Orar é melhor que dormir!”. Essas palavras do chamado adhan ouvida por todos logo ao amanhecer me impressionaram de imediato. Permita-me fazer mais uma pergunta. O que vocês exatamente recitam em suas orações?
Tehranian: Recitamos “Alá é grande”, e logo em seguida “Só há um deus e Maomé é seu profeta”, tudo em árabe.
Ikeda: Então essas são as exatas palavras que vocês declaram ao professar sua fé e, tanto a oração do adhan como os professos da fé são em árabe?
Tehranian: Exatamente. O árabe é usado no mundo todo. Também cumprimentamos um ao outro dizendo “Salam Alaikum!” (Que a paz esteja sobre vós).
Ikeda: Se me lembro corretamente, vocês dizem “Salam Alaikum!” para as pessoas ao redor, olhando para a esquerda e então para a direita, estou certo?
Tehranian: Sim. Simbolizada em nossa oração, essa é uma orientação transcendental na qual se enfrenta o sagrado em uma relação de um para outro, e também é uma orientação social na qual, ao olhar para os outros, você os trata com cordialidade.
Ikeda: Falando em orações, lembro-me de um episódio interessante. Uma mulher japonesa, ao ver seu amigo muçulmano orar todos os dias por diversas vezes, queria saber o motivo de sua devoção. Ela imaginou que ele estivesse passando por sérios problemas, e finalmente perguntou: “O que você está pedindo para Alá? Sucesso nos exames?”. Sua resposta foi uma repreensão: “Você nunca pede um favor a Alá, pois isso não é oração”.
Tehranian: Oração em reverência a Alá e pela paz dos outros é chamada de salat, que não é o mesmo que uma súplica ou pedido de favor a ele. Porém, súplica não é totalmente desconsiderada. Conhecida como doa’a, a súplica é considerada útil, deixando os seres humanos mais próximos de Alá. Em todo caso, a oração é essencial para a veneração de Deus e da paz.
Ikeda: Entendi. O que acho muito interessante no episódio que citei é que os japoneses geralmente oram para alguma divindade pelo sucesso nos exames ou pela felicidade de suas famílias no ano-novo. O provérbio que diz “O homem se curva perante Deus apenas quando está em sofrimento” representa perfeitamente aquelas pessoas que esquecem a oração ou Deus uma vez que seu desejo é alcançado. Visitas a santuários e templos durante o ano-novo geralmente são rituais apenas formais e não uma oração sincera e fervorosa. Na sociedade, aqueles que oram diariamente são considerados como “pessoas fracas que buscam os outros para pedir ajuda”. Em meio a uma sociedade com tantos preconceitos, a Soka Gakkai vem liderando o movimento, por vários anos, em que os membros diariamente realizam suas orações como uma demonstração sincera de sua fé.
Tehranian: Compreendo claramente sua observação. Estar atento, sempre em vigília, é uma postura que vem das orações e nos torna conscientes de nossas bênçãos e das necessidades dos outros.
continua na próxima edição

Editora Brasil Seikyo Ltda.

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